29.8.03

«Não, falei com o teu» Eis um bom exemplo, raro entre nós, de uma campanha com longevidade. Se não me engano, esta campanha do BES já corre há quase dois anos.

As boas ideias são assim: relevantes, mobilizadoras e duráveis. O que significa que o anunciante obtém uma melhor rentabilidade para o investimento que realiza na marca.
O que pode a publicidade? Se, como muitos pretendem, a publicidade tem o poder de mudar as opiniões das pessoas, porque é que a campanha da Prevenção Rodoviária Portuguesa, a mais antiga a correr em Portugal (já lá vão uns trinta anos), geralmente de boa qualidade, às vezes excepcionais, não conseguiu convencer os portugueses a guiar com mais prudência?

No fundo, todos sabemos que o fundamental para reduzir a sinistralidade automóvel está na qualidade das estradas e da sinalização, por um lado, dos veículos automóveis, por outro, e todos concordamos também com o papel essencial da fiscalização policial.

É óbvio que o papel da publicidade é mínimo. Ela é de algum modo eficaz, não porque altere a maneira de pensar das pessoas, mas porque ajuda a manter a atenção do público focalizada no assunto. E já não é pouco.

27.8.03

Confesso que errei. Quando olho para trás, não posso deixar de me surpreender com os meus muitos erros de previsão. De todos eles, um chocará decerto a totalidade dos meus contemporâneos: em 1993, quando comecei a trabalhar a conta da TMN, nunca me passou pela cabeça que um telemóvel fosse uma coisa que em breve toda a gente desejaria ter.

Esse meu cepticismo continuou até 1995, altura em que Romão Mateus lançou o Mimo e as comunicações móveis entraram, decidamente, na era da sua massificação.

Anos mais tarde, também demorei muito tempo a entender o potencial do SMS.

Por isso, se quiserem saber se os telemóveis multimedia estarão em breve nos bolsos de toda a gente, não me perguntem a mim...

21.8.03

Há futuro para as agências? Durante a última década, assisti a muitas discussões, e participei nalgumas, sobre o modo como as agências de publicidade se deveriam transformar para melhor corresponderem às novas condições dos mercados.

Muita ideias surgiram, algumas delas bastante originais, mas temos que reconhecer que, na prática, o modelo que prevaleceu foi aquele que define a criatividade como o core business das agências.

Numa perspectiva estritamente pessoal, não vejo inconveniente nenhum nisso. Acontece, porém, que esse modelo não é o mais indicado para assegurar a boa saúde económica das agências.

A razão é esta: a qualidade do trabalho criativo de uma agência depende esmagadoramente da qualidade dos criativos que ela emprega. É verdade que certas agências conseguem fomentar um ambiente mais favorável ao trabalho criativo, mas esse factor não tem um peso decisivo. Assim sendo, com todas as agências a disputarem entre si o recurso escasso que é o génio criativo, o resultado inevitável é a inflação dos salários ao mesmo tempo que se contraem as margens da actividade.

Diz-se que, nas agências de publicidade, os activos da empresa vão todos os dias dormir a casa. Infelizmente para as agências, neste sistema, eles também levam os lucros para casa; e está certo que assim seja, porque as agências elas mesmas pouco valor acrescentado criam.

Nos tempos áureos da publicidade, as agências detinham um know-how específico que não se aprendia nem se ensinava em mais parte nenhuma: o marketing. É verdade: até há uns 30 anos, nos EUA, e até mais recentemente, na Europa, só nas agências se sabia qualquer coisa sobre isso. Para se perceber como as agências inventaram o marketing moderno, basta ler o Scientific Advertising do Claude Hopkins, publicado nos anos 20 do século passado.

De então para cá, o negócio publicitário foi sendo desarticulado. A agência de serviço completo era o braço de marketing dos anunciantes, mas depois perdeu a produção de peças, a fotografia, a ilustração, a pesquisa, o planeamento de compra de espaço e, finalmente, a estratégia. Mais do que a perda de funções, porém, o que se passou foi a deslocação do know-how fundamental da agência para o anunciante, o que, a prazo, aumentou o poder negocial deste último e transformou a agência num fornecedor como qualquer outro.

O que basicamente distingue as consultoras das agências é que as primeiras criaram a percepção de que geram um fluxo contínuo de ideias inovadoras para os negócios dos seus clientes, ao passo que as segundas continuam a falar das mesmas coisas há décadas. A última ideia de grande sucesso nascida no meio publicitário foi, talvez, a de posicionamento, já lá vão uns bons trinta anos. Não é que não haja outras, mas ou não chegam a ser conhecidas, ou as consultoras apropriam-se delas (como sucede com a gestão integrada da marca ou com o CRM) apesar de o know-how das agências sobre esses temas poder ser bem mais relevante.

As agências correm, assim, o risco de serem percebidas como pouco relevantes para o sucesso comercial dos seus clientes. É isso mesmo, creio, que tem vindo a acontecer.

Por isso, para todos aqueles que, como eu, acreditam que as agências de publicidade continuam a ser as casas onde residem a inteligência e a fantasia que tanta falta fazem no mundo do marketing, o desafio principal é o de consolidar, desenvolver e valorizar o know-how específico que elas legitimamente podem reclamar como seu. Gestão do conhecimento, chama-se hoje a isso.

20.8.03

Por quê estudar marketing? É frequente ouvir-se dizer que a frequência de um curso de marketing serve apenas para ajudar os práticos a arrumarem ideias.

Por outras palavras, eles já têm as ideias; trata-se apenas de classificá-las e ordená-las de uma forma mais racional. Como diria Platão, todo o conhecimento é recordação; logo, os professores apenas nos lembram o que já sabemos.

A forma como os cursos de marketing são conduzidos parece confirmar essa perspectiva: os alunos aprendem sobretudo uma linguagem – o que é marketing, o que é posicionamento, o que é marketing-mix – como se se tratasse apenas de dominar um sistema de nomes e de definições. Quanto à chamada parte prática, consiste sobretudo em resolver casos com recurso ao bom senso, de preferência construindo um discurso que recorre abundantemente às tais definições atrás mencionadas. Um especialista de marketing será, por conseguinte, alguém que fala muito - embora nem sempre a propósito - de segmentação e de imagem de marca, por exemplo.

As pessoas não sabem, mas este sistema de ensino assemelha-se muito àquilo que, na transição da Idade Média para o Renascimento, se chamava Escolástica, ou seja, um sistema de pensamento e de transmissão de conhecimentos que se preocupava mais em construir discursos agradáveis sobre as coisas do que em compreender como elas efectivamente se passam. Isto é facilmente aceite como sabedoria real num país onde a tradição científica é ainda extremamente frágil em comparação com a da retórica pomposa e vazia, de tal modo que os próprios resultados científicos são ensinados sem qualquer referência às experiências e às controvérsias que estiveram na sua origem.

É por essas e outras razões que, pior ainda do que aprenderem pouco, os alunos não são estimulados a pensar; é esse o mais grave problema no nosso sistema de ensino. Permanentemente constato como continua a ser difícil conseguir que pessoas ainda jovens se predisponham a pôr em causa argumentos de autoridade que não entendem e que, por conseguinte, não fizeram seus.
Ora abóbora. «A abóbora que virou sumo» corre o risco de ser um dos slogans mais excitantes do ano.

19.8.03

Tiro na água. O defeito dos spots lançados pelo ICEP para estimular a qualidade da oferta turística não resulta nem da estratégia de comunicação nem da execução criativa, embora também se pudesse dizer alguma coisa acerca disso.

O erro essencial reside na crença ingénua de que a publicidade pode educar o povo neste ou naquele sentido.

Temos a maior dificuldade em convencer os nossos filhos a limpar o nariz, a portarem-se bem à mesa, a serem bons estudantes, e não se meterem na droga, a serem cidadãos responsáveis, apesar de anos a fio de sermões e bons exemplos. Mas acreditamos piamente que um filme de 30 segundos tem o poder mágico de alterar comportamentos anti-sociais de empresários desonestos.

Não haverá aqui um contra-senso?

1.8.03

Eu vou ali e já volto.
O que há de novo. Todas as transformações a que estamos a assistir no mundo da comunicação de marketing resultam de um facto crucial: os bens de consumo correntes (fast moving consumer goods) foram desalojados, por vários motivos, do lugar central que, durante um século, ocuparam no mundo do marketing.

O marketing dos fmcg funcionava de uma forma muito simples. Admitindo que se dispunha de um bom produto, tratava-se de tornar esse produto conhecido do maior número de pessoas através dos mass media e de induzi-las a experimentá-lo recorrendo, se necessário, a actividades promocionais. Em seguida, fazia-se rodar rapidamente o produto nas prateleira dos supermercados de acordo com o princípio pile them high and sell them cheap.

A pouco e pouco, os fabricantes de bens de grande consumo viram reduzido o seu peso nas tabelas dos maiores anunciantes, substituidos por bancos, empresas de telecomunicações, grandes retalhistas e por aí fora. É evidente que isso determina, não só um mix da comunicação muito diferente, como diferentes exigências em relação às agências de publicidade.

Os fmcg são hoje uma área-problema. O fluxo de inovações reduziu-se, os mercados fragmentaram-se, o espaço nos mass media encareceu, o retalho ganhou poder negocial, as margens, enfim, baixaram. Por isso, os mais activos procuram transformar os seus produtos em serviços e, ao fazê-lo, também eles põem em causa as estratégias e as tácticas que durante tempo usaram com êxito.
Lições de posicionamento. Ed McCabe: «You're nobody till somebody hates you.» Outra de que não me lembro o autor: «Posicionamento é o que se diz de nós quando não estamos presentes.»