22.8.11

Mistérios do pricing

A cláusula de rescisão de Falcao era de 45 milhões de euros. O Atlético de Madrid acabara de vender Aguero ao Manchester City por 45 milhões de euros e estava no mercado para comprar um novo avançado.

Aparentemente, seria fácil fechar o negócio.

Mas isso é esquecer que, com razão ou sem ela, Aguero tem mais cotação internacional do que Falcao. Logo, a direção do Atlético teria dificuldade em justificar perante si mesma e perante os associados gastar com o novo jogador todo o dinheiro que ganhara com a venda do antigo.

O Atlético não aceitava pagar 45 milhões e o FC Porto, tendo em vista proteger a sua reputação negocial em negócios futuros, recusava prescindir da cláusula de rescisão.

Foi então que o FC Porto avançou uma proposta surpreendente: o Atlético pagaria 45 milhões por Falcao e receberia Ruben Micael grátis. Mais surpreendentemente ainda, o Atlético aceitou.

Que se passou aqui? No seu livro Predictably Irrational, Dan Ariely recorda uma campanha de angariação de assinantes em que The Economist propunha três alternativas:

1. Assinatura online por US $59.

2. Assinatura da revista em papel por US $125.

3. Assinatura da revista em papel mais online por US $125.

Estão a ver a semelhança? Ora bem, Ariely propôs a um grupo de alunos escolherem apenas entre as alternativas 1 e 3 e a um outro entre todas as três.

No primeiro grupo, 68% dos alunos optaram pela alternativa 1, contra 32% pela 3. Todavia, no segundo grupo, 16% optaram pela alternativa 1, 0% pela 2 e 84% (!) pela 3.

A escolha dos potenciais assinantes da revista é aparentemente irracional, tal como foi a do Atlético no negócio de Falcao.

Todavia, é preciso ter em conta que a transação acordada salvou a face ao Atlético, permitindo-lhe fantasiar que comprara Falcao por 40 milhões e Ruben (un internacional português) por 5, mesmo que não necessitasse para nada deste último.

Quanto ao FC Porto, conservou uma reputação de negociador intratável, dispensando um jogador que, apesar do seu valor, não tem de momento lugar no plantel (sem esquecer que poupou o dinheiro do seu vencimento).

Vale a pena entender os mecanismos psicológicos em jogo nesta negociação, na medida em que nos revelam a inutilidade das teorias da oferta e da procura para explicarem o modo como de facto os preços se formam no mercado.

Nota: A primeira versão deste post tinha uma gralha: o primeiro grupo de alunos de Ariely foi convidado a escolher entre as opções 1 e 3, não entre as opções 1 e 2, como estava escrito.

4.8.11

A desprezada investigação com estudos de caso



Há em Portugal uma estranha sobre-valorização dos métodos quantitativos na investigação de gestão e marketing, bem visível na nada subtil pressão que os alunos de mestrado sofrem para privilegiá-los na elaboração das suas teses.

Nada na teoria ou na prática da gestão justifica esse enviezamento. Por muito úteis que sejam, os métodos quantitativos têm limitações conhecidas e evidentes, de sorte que não só muita da mais relevante produção teórica internacional é de cariz qualitativo como no dia a dia da atividade empresarial é a esse tipo de pesquisa que mais frequentemente se tem que recorrer.

De modo que a preferência pela análise estatística e econométrica ficará provavelmente a dever-se mais ao facto de os professores se sentirem aí mais à vontade do que à preocupação de fomentar competências úteis para a vida profissional.

Acresce que a investigação qualitativa é mais exigente para quem a faz, dado requerer mais cultura geral, mais seriedade no estabelecimento de conclusões e na sua apresentação e maior proficiência no desenvolvimento de argumentos complexos.

Reconhecendo eu as minhas próprias limitações no que toca a metodologias qualitativas, tenho nos últimos tempos procurado suprir essa falha.

"A Arte da Investigação com Estudos de Caso", de Robert E. Stake, proporciona uma valiosa introdução a uma técnica de investigação ao mesmo tempo tão relevante e tão mal compreendida, lamentando-se apenas a medíocre qualidade da tradução portuguesa editada pela Fundação Gulbenkian.

3.8.11

Isto tem alguma graça?



Já apanhei com isto numa quantidade de filmes nos últimos meses.

Jamais escutei, até agora, uma gargalhada franca do público. Pelo contrário, a assistência parece compungida e mesmo algo embaraçada com o total desconchavo da coisa. Quando finalmente acaba, ela suspira de alívio.

É claro que esta ideia poderia ter graça, mas para isso seria preciso que tivesse mesmo graça, não apenas que pretendesse ter graça.

"Outros" é agora o canal mais visto em Portugal



Segundo a Marktest, o conjunto dos canais especializados distribuídos por cabo ultrapassou pela primeira vez, em Julho último, o share do canal generalista líder, a TVI.

Prossegue assim, de forma previsível, a fragmentação das audiências, agora repartida por perto de duas centenas de canais.

Uma boa audiência num canal de cabo não chega hoje - lembrem-se disso - para encher o Estádio da Luz. As audiências de muitos dos canais distribuídos em Portugal não superam, em down time, umas escassas dezenas de telespectadores.

Isto já tem muito pouco a ver com o conceito tradicional de televisão como epítome dos mass media.

2.8.11

E tu, eras capaz de te meter num avião fabricado numa impressora?



Da primeira vez que ouvi falar de impressão 3D não compreendi do que me estavam a falar. Acho por isso normal que, ainda hoje, quase ninguém se tenha apercebido da importância desta revolução que está a decorrer nos bastidores do mundo contemporâneo.

Uma impressora 3D é uma maquineta que, em vez de depositar tinta numa folha de papel, produz objetos de acordo com instruções que recebe de um computador onde foi concebido e desenhado um protótipo usando como matéria-prima materiais plásticos ou metálicos.

Como se pode imagina, elas trabalham por enquanto devagarinho - um bocado como as primeiras impressoras de jato de tinta, lembram-se? - mas em contrapartida não descansam à noite de maneira que, quando a gente acorda, a tarefa está concluída.

De início foram usadas para construir maquetas e modelos em pequena escala. Hoje, porém, são já usadas para fabricar brinquedos, artigos de utilidade doméstica, ou mesmo... aviões.

O SULSA é precisamente o primeiro avião impresso da história, fabricado por uma equipa de engenheiros da Universidade de Southampton.

Se esta tecnologia evoluir tão rapidamente como aconteceu com as impressoras a duas dimensões, dentro de algum tempo compraremos não produtos acabados mas os seus planos de produção e trataremos de fabricá-los nós próprios em nossa casa, eventualmente introduzindo-lhes alterações ao nosso gosto.

Quando isso suceder, os sistemas de produção terão efectivamente alcançado o estágio one-to-one. Estão a ver?