28.9.04

Let's talk about grammar

O que leva uma empresa como a PT, teoricamente com uma imagem a zelar, a veicular nos principais jornais do país um anúncio com um título em várias línguas, que, descontando o facto de não ser nem de longe um bom anúncio, tem erros primários em quase todas as línguas? Embora dirigido a empresas, o tal anúncio da PT Prime parece supor que os quadros portugueses são tão pouco escolarizados que nem vão reparar que "Let’s talk about business" não se traduz por "Laisse parler d’affaires" ou algo do género. Desprezo pelo target? Autismo? Quem souber explique.

14.9.04

Sete anos de truca

Há duas semanas, como andava a recrutar um redactor, fiz apenas duas coisas. Uma delas, naturalmente, foi telefonar para duas ou três pessoas do mercado em cujo julgamento confio. A outra foi mandar um e-mail ao Luís Gaspar pedindo-lhe que colocasse uma notinha na Truca.

O resultado foi o do costume: logo na segunda-feira começaram a chover as candidaturas.

Com sete anos de Truca esta semana, o Luís está merecidamente orgulhoso dos seus 9000 visitantes. Mas a quantidade não é o mais impressionante. Despretensiosamente, como é do seu feitio, o Luís acabou por criar o meio mais certeiro e eficaz que há para falar ao mercado publicitário.

Parabéns ao Luís Gaspar, e obrigado pelas vezes todas em que, precisando de uma forcinha, bastou pedir e… truca!

Escolaridade obrigatória

Quando me iniciei nesta profissão, ainda no Brasil, receei que a falta de formação específica fosse ser para mim uma desvantagem competitiva. Não foi o caso. Nunca senti que os meus colegas que tinham estudado publicidade ou marketing tivessem algum conhecimento essencial que me faltasse. O que não diz nada de especialmente bom a meu respeito; apenas significa que as escolas em que os outros andaram não estavam a cumprir o seu papel.

Cheguei a pensar que o problema era do ensino brasileiro. Mas em Portugal a situação que encontrei era semelhante, senão pior. E, passados muitos anos desde que ando por aqui, não me parece que tenha melhorado muito.

Sempre que avalio candidaturas a emprego ou estágio de gente acabadinha de sair das mais renomadas faculdades de comunicação, marketing ou design, fico impressionado com a ignorância que revelam sobre o mercado em que pretendem entrar, o funcionamento de uma agência, o bê-á-bá do que se propõem fazer. O que sempre me ocorre nessas entrevistas é que felizmente não se formaram em medicina.

Não é que entre os recém-diplomados não haja quem tenha sabido aproveitar o tempo gasto na escola. Nos melhores casos adquiriram hábitos de trabalho e pesquisa, organização mental, alguma cultura geral. Mas face ao investimento que um curso superior representa, quer para o aluno e a sua família, quer para a sociedade, é um retorno bastante magro.

Estudantes teoricamente habilitados a trabalhar como publicitários andaram anos a cursar cadeiras como "Criatividade Publicitária III" e nunca leram nenhum livro sobre o assunto. Saem da faculdade tão desinformados sobre a estrutura de uma agência que tanto lhes faz trabalhar como executivos de conta, redactores ou directores de arte. Parece-lhes que é mais ou menos a mesma coisa.

Se as escolas não cumprem o seu papel, ele terá inevitavelmente que ser desempenhado pelas agências. O que é cada vez mais complicado: com pouca folga financeira, as agências não têm os meios ou o desejo de investir a sério em formação. Além disso, como mesmo os seus quadros mais experientes sofrem de idênticas deficiências de base, nem sequer há lá muita gente capaz de ensinar os mais novos.

É provável que as Etics, Restarts e outras escolas do género, mais plugadas nas necessidades do mercado profissional, venham trazer alguma melhora a este cenário. São cursos mais rápidos, mais específicos, e certamente benéficos. O que não elimina a obrigação urgente das faculdades de comunicação e publicidade de reverem a sua estrutura e currículos. Se não o fizerem, continuarão simplesmente a vender gato por lebre.

12.9.04

Bem passado ou mal passado?

Quando perguntam a Steve Harrison, da Harrison Troughton Wunderman, qual é a sua fórmula para conseguir a excelência criativa que fez da sua agência uma das mais premiadas do mercado inglês, e fez com que ele próprio fosse considerado pela Campaign um dos dez melhores directores criativos britânicos, a sua resposta é de uma decepcionante simplicidade: "Na HTW os briefs levam duas vezes mais tempo a fazer do que o trabalho criativo".

Até onde eu sei, este não é o método de trabalho na maior parte das agências do mundo. Em Portugal, se acontecer algo parecido em um ou dois sítios já será bastante surpreendente. A atitude mais comum em relação ao brief é burocrática. Trata-se de um papel que é preciso preencher, transcrevendo para o formulário próprio o pedido e as informações (quando as há) do cliente. Não é um processo criativo -- a criatividade só é esperada na resposta ao brief, não dentro dele.

Há vários factores na estrutura das agências que favorecem essa má compreensão do que é e como se faz um brief. O planeador estratégico, como função separada, é uma figura rara no mercado português. A responsabilidade de planear acaba por ficar difusa: às vezes será assumida pelo área dos estudos de mercado (por razões que para mim não são nada evidentes), nas agências em que essa área existe; às vezes será do director criativo; quase sempre caberá ao contacto. Há agências em que "planeamento estratégico" é uma expressão simplesmente desconhecida. Existem, sim, os briefs, cujo "preenchimento" cabe aos executivos de conta.

O problema é que muitos desses executivos nem desconfiam que um brief nada mais é do que o resumo de uma estratégia. E uma estratégia pressupõe uma ideia. Se não há uma ideia, de preferência uma grande ideia estratégica, não há nenhum brief a ser passado. Pode haver um pedido, uma encomenda, uma batata quente, um anúncio para entregar amanhã às nove, mas brief não há.

No seu "Disruption", Jean Marie Dru mostra-se adepto de uma fórmula parecida com a de Steve Harrison. Para ele, as ideias "disruptivas" ocorrem sempre entre a estratégia de marketing e o processo criativo -- é o que ele chama de "Disruption Interval", uma fase do trabalho em que as agências, também no seu entender, deveriam investir muito mais.

É ainda de Jean Marie Dru a citaçãozinha com que termino (em inglês, claro, porque sempre fica bem): "Twenty-five years ago, when I was an account executive, I asked my boss what was the most important part of my job. Without hesitating, he answered, ‘The creative brief. Better briefs make more money’ (…) A lousy brief will have to be redone. A bad brief means time lost. A typical agency can lose a full third of creative time due to irrelevant or uninspiring briefs".

Quem sou eu para discordar.

9.9.04

A imaginação

«A imaginação é tanto mais activa quanto menos percepções do exterior nos forem transmitidas pelos sentidos. Uma prolongada solidão, a prisão ou um leito de doença, o silêncio, o crepúsculo, a escuridão, são-lhe propícios: sob a sua influência, entra em actividade sem ser invocada.

«Não obstante, para que a imaginação seja frutuosa, é preciso que tenha recebido muito material do mundo exterior, pois só isso pode encher a sua despensa.»

Schopenhauer.

7.9.04

Haydn direct-mailer

A 3 de Dezembro de 1781, Josef Haydn, mestre de capela de Sua Alteza Sereníssima, o Príncipe Nicolau Esterházy, dirigiu aos seus amigos e aos seus mecenas uma carta circular. A carta endereçada ao Príncipe Krafft-Ernst von-Oettingen, que chegou até nós, dizia o seguinte:

Alteza Sereníssima, Gracioso Príncipe e Venerável Senhor!

Na vossa qualidade de grande mecenas e conhecedor de música, permito-me apresentar a Vossa Alteza Sereníssima os meus recentíssimos quartetos para 2 violinos, viola e violoncelo concertante, correctamente copiados, ao preço de assinatura de 6 ducados. Estão escritos num estilo novo e particular, porque há já 10 anos que eu não compunha quartetos. Os nobres assinantes residentes no estrangeiro receberão os seus exemplares antes de serem editados aqui. Solicito o vosso acolhimento favorável para esta oferta. Sou, como sempre, o mais humilde e devotado servidor de Vossa Alteza Sereníssima,

Josephus Haydn
Mestre de Capela do Príncipe Esterházy

Viena, 3 de dezembro (1781)

Newspeak

Não é cunha, é network marketing.

4.9.04

Quando o marketing funciona

Agora, que o 3G está aí, o público pode experimentá-lo e fazer as suas escolhas. Dispomos, pois, de factos, factos sólidos, sobre os quais é possível elaborar inferências e testar conjecturas.

Primeiro facto: o 3G reduz drasticamente os custo de transmissão de voz. Logo, está aí uma vantagem interessante para os consumidores que aderirem a esta teconologia: a possibilidade de pagarem menos pelas suas chamadas. Não é a «killer-application» que se esperava, mas enfim...

Segundo facto: como o 3G permite oferecer uma variedade de serviços distintos para diferentes tipos de utilizadores, o mercado tende a segmentar-se segundo as preferências dos clientes. Ao contrário do tradicional serviço de voz, os serviços 3G são muito específicos. Interessam muito a certas pessoas, mas absolutamente nada a outras.

As experiências do Japão e da Coreia, os países mais avançados na adopção da tecnologia, mostra que certos segmentos se interessam por video, outros por música, outros por jogos, outros por informação de trânsito, outros por transmissão de dados, outros serviços de notícias, etc. a Coreia, um operador oferece já pacotes de serviços distintos por escalão etário ou por sexo.

Começam a aparecer empresas especializadas na criação e difusão de conteúdos através das redes móveis, os «mobile virtual networks operators» (MVNO). Empresas como a Virgin, a Tesco, a 7-Eleven e a MTV estabeleceram-se já como MVNOs. A Disney está também interessada.

Conseguirão os operadores de telecomunicações tradicionais progredir a juzante e entrar na indústria dos conteúdos? Ou ficarão encurralados na sua posição tradicional de grossistas de redes digitais? Ao que parece, a convergência era também uma fantasia sem bases.

Quem tem unhas é que toca guitarra, ou seja, o facto de alguém possuir um canal não lhe confere nenhuma vantagem comparativa especial quando se trata de criar os serviços que serão difundidos e comercializados através dele.

Quando o marketing não funciona

O marketing recomenda que se inquira junto das pessoas o que é que elas de facto querem.

Acontece que, às vezes, elas não sabem. É o que sucede, por exemplo, quando estão em causa produtos ou serviços radicalmente inovadores, acerca dos quais não dispõem de qualquer experiência.

Há poucos anos, as empresas de telecomunicações meteram-se a adivinhar o futuro da 3ª geração de comunicações móveis. Fantasiaram uma procura extraordinária e pagaram, em consequência, fortunas pelas licenças que os Estados puseram a leilão.

Sabemos hoje que estavam redondamente enganadas.

3.9.04

O pouco que sei sobre marketing bancário

Há algum tempo vi um video onde diversas pessoas explicavam como tinham escolhido ser clientes deste ou daquele banco. Um preferira o banco que ficava mais perto de casa. Outro, o banco mais perto do emprego. Outro, o banco do pai. Outro, o banco onde o avô lhe oferecera ao nascer um certificado de aforro. Outro, o banco por onde a empresa se propunha pagar-lhe o ordenado. Outro, o banco que lhe oferecera a melhor taxa no crédito à habitação. Outro, porque conhecia alguém que trabalhava lá. E por aí fora.

O que mais surpreende nestas declarações é a inércia das vítimas. Segundo os manuais, as pessoas são supostas tomar decisões informadas; na realidade, elas deixam-se arrastar por uma corrente de acontecimentos que não dominam nem tentam dominar.

Se acham que esta atitude não é racional, entendam que, na cabeça das pessoas um banco é tão bom como qualquer outro - por isso tanto faz. Há aí alguém disponível para lhes explicar que estão erradas? Se calhar, não estão.

Cheguei, então, a uma conclusão. Não há verdadeiramente razões que levem as pessoas a seleccionar um banco. O que há é situações que as encaminham num ou noutro sentido.

Essas situações são numerosas, embora inventariáveis: a chegada à idade adulta, a compra de habitação, a mudança de emprego, etc. Talvez seja possível proceder à sua identificação sistemática, mas é duvidoso que essa seja uma forma eficiente de, no actual estado de indiferenciação da oferta bancária, captar novos clientes. Logo, como, quando uma pessoa se inclina para um banco, a única coisa relevante é que o considere uma solução aceitável, o fundamental é a publicidade criar saliência para a marca.

Hoje, o fulcro da concorrência bancária não é a captação de novos clientes, mas a capacidade de fazer mais negócio com os clientes que já se tem. Uma grande proporção dos clientes bancários, que sobe ainda mais quando nos concentramos nos de maior valor, tem conta em mais do que um banco. A penetração no património dos clientes é, por conseguinte, o grande desafio que se coloca à gestão de marketing.

Para fazer isto eficazmente é preciso dispor-se de informação adequada e rigorosa sobre a situação e os objectivos financeiros dos clientes, que depois permitirá orientar programas eficazes de marketing relacional. Digam-me então uma coisa: acham que os vossos bancos estão a fazê-lo?

2.9.04

A imagem de marca existe?

De há uns tempos a esta parte comecei a desconfiar de que a imagem de marca seja um conceito relevante para a comunicação de marketing.

A razão é esta: não sei se de facto existe. Tenho repetidamente constatado que, quando as pessoas são instadas a referir o que lhes vem à cabeça quando é mencionada uma determinada marca, elas falam apenas de dois tipos de coisas: a) ideias, símbolos e sentimentos que não se reportam verdadeiramente à marca, mas em geral à categoria de produto; b) atributos triviais da marca, tais como embalagens ou variantes de produto.

Fui assim levado a formular a seguinte conjectura. Uma marca não deve esforçar-se por assumir rasgos de imagem distintos da concorrência, mas apenas por se identificar o melhor possível com a simbologia que o público espontaneamente associa à categoria.

Vou pensar melhor nisto.