18.3.10

Aprender e ensinar

Pedro Bidarra ("Cursos inferiores", i de 16.3.10) mistura duas questões diferentes:

1. Se deve haver cursos superiores de Marketing e Publicidade.

2. Se é possível ensinar-se Marketing e Publicidade.

Não quero tratar agora da primeira, embora possa adiantar que a minha opinião coincide em parte com a dele.

Começarei por fazer notar que mesmo quem duvida que se possa ensinar essas matérias tende a crerque elas possam ser aprendidas. Se fossemos franceses, talvez o debate terminasse aqui, porque, na língua deles, a palavra "apprendre" significa tanto aprender como ensinar.

Aparentemente, o Pedro acredita que a experiência de vida é a melhor maneira de aprender. Esta tese não é nova. O Dr. Antunes Guimarães, Ministro da Educação de um governo de Salazar, por exemplo, opinava que saber ler e escrever não seria assim tão importante, visto que, apesar de analfabeto, Vasco da Gama descobriu o caminho marítimo para a Índia.

Mas é claro que o Pedro Bidarra não partilha essa opinião algo extrema. Ele acredita que se pode e deve ensinar coisas como Economia, Matemática ou mesmo Gestão. Mas não - jamais! - Marketing e Publicidade.

Também aqui eu concordo em parte. O Marketing não é uma ciência, é uma arte ou um saber prático que se socorre de alguns conhecimentos de economia, sociologia, antropologia e estatística (entre outros) e de uma larga variedade de técnicas.

Como se adquirem então os conhecimentos necessários para trabalhar em Marketing ou em Publicidade? Uma hipótese - aquela que Pedro Bidarra parece preferir - consistiria na aprendizagem on the job. Mas como? Meramente frequentando departamentos de marketing e agências e convivendo com os profissionais do ofício?

Atrevo-me a afirmar que deixar a cada um o encargo de aprender através da sua experiência individual é uma forma muito ineficiente de educação. A coisa falha com demasiada frequência, mesmo quando existe uma vontade deliberada de orientar o aprendiz. Primeiro, porque quem sabe fazer não sabe forçosamente ensinar. Segundo, porque num ambiente de pressão laboral faltam tempo e pachorra para dar aos novatos a atenção que eles requerem.

Foi por isso que, historicamente, a educação formal substituíu em muitas profissões (é certo que não só com vantagens) o mero treino sob a direcção de um mestre.

O Pedro Bidarra aceita que se pode ensinar Gestão - uma certeza que a mim me espanta - mas desconfia da utilidade de cursos de Marketing, quando o currículo de um bom curso de Marketing deve coincidir pelo menos em 50% com o de um curso de Gestão.

Ora, há hoje uma desconfiança generalizada em relação ao modo como actualmente se ensina Gestão, dado que não só não se trata de uma ciência, como não faz qualquer sentido condicionar o acesso à profissão à posse de uma licenciatura na área. Ninguém é gestor pelo facto de tirar um curso de Gestão exactamente do mesmo modo que ninguém é publicitário pelo facto de tirar um curso de Publicidade.

Que género de coisas se pode então ensinar num curso de Publicidade? Tal como noutras profissões criativas (design, arquitectura, música, cinema) a actividade publicitária comporta uma dimensão técnica e outra de inspiração. A primeira pode-se ensinar, e a segunda pode-se estimular e treinar.

É isso que se faz em todos os países onde a publicidade atingiu um elevado nível (EUA, Inglaterra ou Brasil, por exemplo), mas não se faz cá. Entre nós confia-se demasiado no acaso do talento individual, o que ajuda a explicar o muito baixo nível médio tanto da publicidade como das restantes actividades criativas.

Eu não sei se as escolas portuguesas onde os jovens são introduzidos aos rudimentos da publicidade funcionam bem ou mal, porque ignoro os seus métodos e programas. Sei, porém, que ninguém pode ensinar aquilo que não sabe, e que em Portugal se valoriza muito o saber livresco e pouco os saberes adquiridos no exercício de uma profissão. Sei também que o ensino continua em geral a basear-se muito em palestras na sala de aula e pouco em trabalho aplicado.

Se o ensino de Marketing e Publicidade funciona mal - e eu acredito que assim seja - deveriamos empenhar-nos em fazê-lo funcionar melhor, não em argumentar absurdamente que essas coisas não se ensinam.

7 comentários:

cjt disse...

Acho estranho este artigo vir da mão do vice-presidente da BBDO - de quem não sei qual seja a formação base, nem tão pouco irei saber, por ora - mas creio que a fundamentação desta opinião é falaciosa.
Primeiro, porque aparenta (e chega a confessar) a mais completa ignorância em relação aos cursos e às matérias que nestes são seleccionadas.
Depois, porque baseia a sua opinião em algo que ouviu dizer a alguém, o que não é decerto a melhor forma de ajuizar.

O debate em torno de uma formação em marketing, publicidade e outras é exactamente o mesmo que se poderá ter relativamente a qualquer área da comunicação. Aliás, será sintomático disso que se discuta ainda hoje se a comunicação é ou não uma ciência, optando-se geralmente pelo título algo ambíguo de "Ciências da Comunicação", o que remete para a ideia de ser - que é - a comunicação o produto de diversos conhecimentos científicos.
Com efeito, podemos dizer que quem estude comunicação não conseguirá ser nesta formado a não ser que possua conhecimentos de teorias e modelos de comunicação, psicologia, sociologia, antropologia, gestão, direito, filosofia, linguística, semiótica, línguas e culturas, etc. ...e já vamos em ciências e letras.

Com efeito, não existe no ensino superior capacidade, quer de recursos, quer de tempo, para abordar aprofundadamente todos os aspectos de todas estas ciências e letras. Mas, no caso da publicidade e do marketing, como no da comunicação, a escola é apenas um ponto de partida que permite aos alunos adquirirem um "índice de temas" e algumas boas práticas. O resto, compete-lhes a eles e ao mercado de trabalho.

Seria bom - tome-se o meu caso como exemplo - que não fosse necessário um curso superior para o exercício dessas funções (como não o é, de resto, em muitos locais). Já considero, no entanto, um contrasenso dizer-se que «não estudem marketing, estudem gestão...» e por aí fora.
Isso é um tiro no pé.

Confundir um pequeno resumo de um capítulo de um livro de kotler, ou de scheinson, ou de grunig - apenas de um deles, que um curso de gestão não dá para mais - com toda a matéria que se aprende nos anos de escola especializada, bem ou mal, nesses assuntos é um erro.
Eu sou aluno de um curso de comunicação que me oferecau até á data uma diversidade de conhecimento que considero essencial ao início da actividade, a par de uma visão global das coisas: teorias e modelos de comunicação, análise do discurso, práticas textuais, retórica, comunicação institucional, três línguas estrangeiras - disciplinas estas dadas a par de outras como técnicas e tecnologias de tradução, tic's, introdução ao direito, ética e deontologia, gestão...

Não serei, contuno, especialista em nenhuma das matérias mas é facto que, em todo o caso, ao entrar numa empresa terei uma compreensão muito mais alargada do seu funcionamento e das suas interacções com as diversas envolventes, do que se fosse apenas formado on the job, para aquele servicinho e mais nada.

Um abraço, CJT

(vou tentar repetir este comentário no 'i')

Filipe Carvalho disse...

Então e se o curso (de Pós-graduação) for de Marketing de Vinhos?

João Pinto e Castro disse...

Não percebi qual é a sua pergunta, Filipe.

Anónimo disse...

Esta ideia vinda de um psicólogo que nunca exerceu a actividade, e que como 1ºemprego criava musica para piano tem muito que se lhe diga...

Mas verdade que foi ai que descobriu o seu talento. Mas também deu (como todos nós) alguns tiros muito ao lado.

Quando o srº PB diz que falar sobre anúncios é "galhofa" até vou ao seu encontro, porém dizer que um curso de Marketing de nada vale, é pura ignorãncia...

E ele tem a ousadia de o dizer, porque nunca na vida será professor de publicidade numa escola 8não precisa).

Os cursos estão intimamente ligados ás capacidades das escolas recrutarem bons professores. E é aqui que começam as dificuldades...

Há muito professor que não sabe ensinar e outros que são tão teóricos que na práctica como profissionais de nada valem.

Os bons professores não tem tempo para dar aulas a sério apenas umas palestras!

Abraços..

jayme.kopke disse...

O artigo é pretensioso (será só galhofa?) e denota aquilo que o autor critica: ignorância. Obviamente a publicidade, como qualquer outra actividade humana, pode ser aprendida e ensinada. E não tenho dúvidas de que Pedro Bidarra é um excelente professor. Quem o diz é o meu bom senso - se não fosse bom professor não valeria nada como director criativo - mas também o que tenho ouvido de quem já trabalhou com ele. Que o ensino se dê na sala de uma agência ou numa sala de aulas é totalmente irrelevante: o que importa é a qualidade de quem ensina e também a disponibilidade, talento e interesse de quem aprende. Nunca estudei publicidade formalmente - na altura que comecei certamente não havia boas escolas no Rio de Janeiro - mas tenho pena, porque o que depois fui aprendendo custou muito mais esforço e uns quantos erros, pagos às vezes não por mim, mas pelos anunciantes. As escolas existem precisamente para substituir esse modo primitivo de aprender. Daí a serem boas só por existirem não é, evidentemente, forçoso. Há uns anos tenho a certeza de que não havia muitas boas, nem em Portugal nem num mercado muito mais maduro, como o Brasil. As boas escolas eram as agências. Agora, desconfio que o panorama já melhorou muito, tanto lá como cá. Mas, mesmo que não haja por aqui escolas excelentes, sempre há bons livros, que são outro tipo de escola. Muitos dos alunos que já tive, por exemplo na Restart, eram muito pouco inclinados a ler sobre publicidade. Talvez pensassem, como o Bidarra, que é uma arte que já se nasce sabendo, ou não, e que toda a experiência codificada em cento e tal anos de prática não serve para nada. Arrisco afirmar que é dessa forma de pensar, mais do que da inutilidade das escolas, que decorre o mau nível da maior parte da publicidade que se produz no mundo.

Consumering disse...

O mal está em achar que marketing&publicidade é uma arte.

não é, é uma quase-ciencia de vender e por isso sim pode ser ensinado. ensinado por quem sabe claro.

Quem não sabe os rudimentos da matéria, quem confunde arte com negócio, não será nunca um bom professor de marketing. nem nas escolas nem no job.

Anónimo disse...

Será que na agência deste ilustre publicitário só trabalham biólogos e engenheiros mecânicos e afins ???