Façamos de conta que as minhas objecções em relação à Marca Portugal não faziam nenhum sentido. Qual deveria então ser o posicionamento mais indicado para o país?
Quando foi convidado a trabalhar para o Governo português, há uns bons 15 anos atrás, Wally Olins notou certa vez, ao ver um mapa de Europa virado ao contrário (ou seja, com o Norte virado para o Sul e vice-versa) algo que até aí lhe passara despercebido: Portugal é o único país Atlântico do Sul da Europa.
É claro que a Espanha também tem uma costa atlântica, mas não só ela está no essencial virada ao Norte, como de facto o país é no seu núcleo definidor mediterrânico e continental.
Perguntar-se-á que relevância tem isso. Ora a localização geográfica não é no caso de Portugal - como não o é no de nenhum outro país - uma mera curiosidade sem consequências. A situação que ocupa teve e tem um papel determinante na sua história e na sua cultura, como zona de transição entre o Mediterrâneo e o Atlântico (logo de relação marítima entre o Sul e o Norte da Europa), entre a Europa e a África e entre a Europa e as Américas.
Logo, é correcto, como tentou Olins, fazer assentar o posicionamento do país nessa dupla condição de país meridional e atlântico.
Mas é evidente que o desdobramento deste conceito de partida numa comunicação bem concebida e eficaz teria de estribar-se num entendimento aprofundado da relação histórica entre a posição geo-estratégica compreendida em sentido amplo e a nossa originalidade cultural. Note-se, de passagem, como esse conceito é simultaneamente válido para promover o turismo, estimular as exportações e atrair o investimento estrangeiro.
Sabe-se que isso nunca aconteceu, tanto por incapacidade das pessoas e instituições à época incumbidas de trabalhar no projecto como por facciosismo partidário dos governos posteriores, de modo que a Marca Portugal andou perdida pelos arquivos do Ministério da Economia durante muitos anos.
Em 2002, porém, o tema foi ressuscitado pela BBDO, a agência de publicidade que por essa altura propôs o conceito "Europe's West Coast" como o mais apropriado para posicionar Portugal. As suas razões foram expostas num inteligente e bem argumentado artigo que Pedro Bidarra deu à estampa no Público em 2003.
Resumindo, o que aí se dizia era que a percepção de Portugal como um país do Sul não é positiva para o país, visto que não só o Sul conota ideias negativas tais como sub-desenvolvimento e atraso cultural, como as coisas boas usualmente associadas ao Sul existem mais na Itália, na Espanha e na Grécia.
Logo, seria mais indicado insistirmos na dimensão ocidental da nossa identidade, muito mais autêntica e relevante do que a mediterrânica. Acresce que a expressão "West Coast" faz lembrar a Califórnia, a costa ocidental americana, que além do sol e da praia tem também a tecnologia e o cinema. Portugal deveria então promover-se externamente como a "Europe's West Coast".
À primeira vista, a recomendação da BBDO parece enquadrar-se, com algumas nuances, nas ideias de Wally Olins.
Detecto nela, todavia, alguns inconvenientes. O primeiro é a presunção de que toda a gente em todo o mundo pensa na Califórnia quando se fala de West Coast. Ora o Mundo está cheio de costas ocidentais, pelo que a associação está mais na cabeça de quem a propõe do que no espírito de quem é suposto fazê-la.
Em segundo lugar, a ideia de fazer de Portugal a Califórnia da Europa não só é velhíssima como, por razões que talvez não seja necessário detalhar, me parece descabida.
Por último - e este é o ponto mais importante - reduzir a identidade do país à sua ocidentalidade é obviamente amputá-la de um componente essencial. Portugal não é só um país ocidental, tal como não é só um país meridional: é, repito-o, o único país atlântico do Sul da Europa.
Se Portugal fosse só um país meridional não seria o que é, tal como não o seria se a sua essência se reduzisse à ocidentalidade. Afinal, nós não somos a Irlanda, que, quer se queira quer não, mais milha menos milha, é de facto, no plano simbólico se não exactamente no dos factos, o extremo ocidental da Europa.