17.12.06

Greatness by Neil French
Entrevista a David Ogilvy

A entrevista é interrompida abruptamente a meio. Ainda assim, pareceu-me interessante inseri-la aqui, porque foi a única que encontrei no YouTube.

(Sim, é verdade: no fundo, ao cabo de tantos anos, continuo a ser um ogilviano.)

10.12.06

Será o marketing uma panaceia?

Obviamente que não – na medida em que nada o é.

Não vai ser o marketing a evitar um tsunami, por exemplo. Mas, para tudo em que o trabalho humano faz diferença, uma pequena injecção de bom marketing é quase sempre o que falta para que de cada esforço resulte mais felicidade.

E isso não vale só para as empresas com um departamento de marketing no organigrama. O Henrique Agostinho tem demonstrado, no Diário Económico e no consumering, que também valeria para Portugal. Um melhor marketing (que para ele, com toda a razão, equivale a menos, muito menos marketing do que se tem feito) significaria mais exportações, mais empregos, mais riqueza para si e para mim.

Mas o que é verdade para as empresas e os países também é verdade para qualquer cidadão na rua. Há uns dias, deixaram-me na caixa de correio um daqueles cartõezinhos do electricista/marceneiro/pintor do bairro. Marketing um bocado básico, não é? Mas eficaz – como se verificou logo no dia seguinte: tive um problema com a canalização e a primeira coisa que me ocorreu foi ligar para o sr. Lindolfo, o dito faz-tudo. Grande azar: canalizações era a única especialidade que ele não tinha. Pediu desculpas, agradeceu o telefonema e desligou.

Mau marketing. O que ele devia ter feito: 1. anotar o meu nome, morada e telefone; 2. ligar para um colega canalizador e mandá-lo a minha casa no mesmo dia; 3. telefonar depois, para ver se correra tudo bem; 4. de posse do meu nome e morada, mandar-me um cartão de boas festas por estes dias, para eu nunca mais esquecer que ele existe.

Ganhava eu, porque tinha o problema resolvido. Ganhava o colega, porque tinha trabalho. Ganhava o sr. Lindolfo, porque ia ter em mim não só um cliente para a vida, como alguém que o recomendaria entusiasticamente na primeira oportunidade.

O que o sr. Lindolfo teria feito nesse caso era partir da sua acão de acquisition marketing via dropmail para uma lógica de loyalty building: primeiro com o cross selling através de uma joint venture, depois com o database marketing como base para o customer relationship marketing.

Como o budget do sr. Lindolfo não dá para essas palavras importadas, ainda bem que ele não ia precisar delas. Aliás, não precisava nem sequer da palavra marketing. Uma atitude de marketing chegava e sobrava.

26.11.06

Insights



Enquanto o João não comenta, como prometido, comento eu o outro filme citado pelo Mar Salgado. O que é que ele tem que a campanha da TV Cabo não tem?

O que ele tem é algo que em publicitês se chama um insight.

Um insight é algo que descobrimos sobre a nossa audiência e que, quando traduzido na comunicação, é uma revelação para a própria audiência. Não sendo um fã de futebol, acredito que, para quem o é, o anúncio da Vodafone provoque essa pequena epifania, que gera logo adesão e cumplicidade. Olhamos para o anúncio (mas podia ser para o retrato, para o poema, para a observação do amigo) e dentro de nós alguma coisa ressoa: “Apanharam-me. É mesmo assim que se passa comigo”.

Não é qualquer peça publicitária que consegue basear-se num verdadeiro insight sobre o target. Muitas nem precisarão de tanto. Mas desconfio que as que realmente criam uma adesão emocional duradoura contêm sempre esse raro ingrediente.

Got milk? tem um insight. A antológica campanha da Brastemp (“Não é uma Brastemp, mas…") tem um insight. Mais antiga ainda, também brasileira e da mesma agência, a campanha das camisas US Top tinha um insight fabuloso sobre por que nos vestimos assim ou assado e como funciona toda a sociedade. E tudo isso cabia em 30 segundos.

Quando um anúncio é feito a partir de um insight a sério, nem faz falta que a forma de contar a história seja especialmente interessante. Lembro-me daquele velho spot do Nescafé com a rapariga e o carocha. Ou desta campanha, que também não me parece ter uma execução particularmente criativa, mas que pelo menos para mim teve um enorme impacto, ao pôr o dedo direitinho na ferida. No mesmo dia em que a vi no hidden persuader, tinha sido abordado na rua por um voluntário da AMI. Lembro-me de ter olhado para a pessoa com toda a simpatia que sinto pela instituição – mas não dei dinheiro. Era como se a simpatia e o respeito pela causa bastassem. Fiquei-me pelo quase – exactamente como me mostrou, horas mais tarde, o anúncio.

O insight que estava no brief da campanha transformou-se num insight sobre mim próprio. E, depois disso, a minha atitude sobre o tema (nesse caso, ajudar outras pessoas) nunca mais será a mesma.

24.11.06

"Tira-me essa imoralidade daqui!"

O Pedro Caeiro desafia-nos a comentarmos duas campanhas actualmente no ar: a) a da TV Cabo em que a esposa abandona o lar por o marido não assinar a TV Cabo; e b) a da Vodafone promovendo as mensagens que anunciam os golos da Champions League.

Quem somos nós, pobre blogue de trazer por casa, para recusarmos um convite do Mar Salgado?

Comecemos então pela primeira campanha.

No Mar Salgado lêem-se duas opiniões sobre ela:

1. Vasco Lobo Xavier acha a campanha imoral e teme que seja eficaz. Fico sem perceber se acredita que a imoralidade aumenta em geral a eficácia da publicidade ou se, pelo contrário, está inclinado a pensar que uma coisa nada tem a ver com a outra.

2. Pedro Caeiro acha a campanha ridícula, logo ineficaz, desvalorizando de alguma forma a acusação de imoralidade.

O problema começa logo na dificuldade de nos entendermos sobre o que significa aqui a palavra “ridículo”. Provavelmente, o Pedro Caeiro quer dizer que a situação é inverosímil: ninguém no seu perfeito juízo abandonaria o lar por não ter TV Cabo. Mas sabe-se que o exagero temperado pelo humor (chama-se a isso “hiperbolização simpática”) é uma técnica publicitária com créditos firmados.

Aparentemente, o problema aqui é que, das duas uma:

a) Ou a campanha da TV Cabo não tem piada;

b) Ou os nossos marinheiros não têm espírito de humor.

Eu inclino-me a dizer que a campanha tem alguma piada, embora não muita, e que tanto o PC como o VLX desconfiam que o público não é suficientemente inteligente para entender que aquilo não deve ser tomado a sério. Creio que esta última presunção só é razoável quando estamos a lidar com crianças ou atrasados mentais.

Passemos agora ao tema da moralidade.

A publicidade é uma das actividades comerciais mais regulamentadas do mundo, em parte para proteger os consumidores de alegações falsas ou meramente enganadoras, o que em muitos casos me parece bem, em parte para prevenir a difusão de comportamentos considerados indesejáveis como a dependência do álcool ou do tabaco, o que por regra me parece mal.

A parte das regulamentações de que discordo é precisamente aquela que visa a) a promoção de ideias ou práticas moralmente recomendáveis ou socialmente valorizadas; ou b) a dissuasão de hábitos pecaminosos ou condenáveis.

Adianto dois argumentos em defesa do meu ponto de vista:

1. Embora pessoalmente deplore a publicidade ofensiva para a dignidade de certas pessoas ou grupos, oponho-me à aplicação de critérios de censura moral tanto à publicidade como a qualquer outra forma de expressão. Apesar disso, não só reconheço aos consumidores ofendidos o direito de boicotarem a marca prevaricadora, como recomendo que se organizem colectivamente para tornarem mais eficazes os seus protestos.

2. Ao arrepio de um preconceito muito difundido, a publicidade não tem o poder de alterar o modo como as pessoas pensam. Como sei que não vão acreditar em mim, coloco-vos a seguinte pergunta: como se explica que tantas pessoas continuem a fumar apesar de os maços de tabaco ostentarem dizeres proclamando que “fumar mata”?

Em conclusão, e assim me calo:

1. A campanha da TV Cabo pretende sublinhar que a assinatura mensal é baixíssima, sobretudo tendo em conta o acréscimo de felicidade que pode trazer à família. Suponho que toda a gente entende isto.

2. Será o preço o principal factor inibidor da adesão de novos clientes? Não faço a mínima ideia. Se for, a campanha estará no caminho certo. Se não for, provavelmente fracassará.

3. O exagero é perfeitamente aceite pelos consumidores, desde que fique claro que não esperamos que eles tomem à letra o que estamos a dizer. Criativamente não acho a campanha fantástica, mas apenas aceitável. Acresce que a execução é mesmo fracota.

4. Repugna-me o controlo moral da publicidade. A publicidade não torna o mundo nem melhor nem pior. Basicamente é uma força conservadora que se limita a reforças as ideias e os preconceitos dominantes.

5. As ideias criativas sugeridas pelo Vasco Lobo Xavier para a promoção de variadas marcas são moderadamente divertidas, mas receio que não demasiado originais.

6. Tal como qualquer outro consumidor, o Vasco Lobo Xavier pode apresentar uma queixa sobre este assunto ao ICAP, instituto privado de auto-regulação da publicidade em Portugal, cuja Comissão de Ética, constituída por personalidades independentes, se pronunciará sobre ela. Alternativa ou complementarmente, pode apelar também para o Instituto de Defesa do Consumidor.

(O comentário à segunda campanha fica para depois.)

22.11.06

Eu não fiz as contas



Os serviços financeiros configuram uma daquelas situações em que existe uma assimetria essencial entre o fornecedor e o cliente.

O fornecedor é um especialista dotado de conhecimentos sofisticados numa área particular. O cliente, mesmo quando não é totalmente ignorante na matéria, não dispõe nem do tempo nem da disponibilidade mental necessárias para: a) ter acesso a toda a informação relevante; b) interpretá-la correctamente; c) escolher aquilo que é melhor para si.

É por isso que ser-se cliente de um banco implica uma relação de confiança, o que significa que nós acreditamos que o nosso banco não abusará da nossa situação de inferioridade para lucrar indevidamente à nossa custa.

A reacção dos bancos portugueses às acusações de que têm sido alvo nas últimas semanas sugere que eles ainda não compreenderam - ou não quiseram compreender - aquilo que de facto está em causa.

Eles não podem dizer que a) os arredondamentos das taxas de juro dos créditos à habitação eram até agora legais; b) os bancos não esconderam dos seus clientes que procediam a esse arrendondamento; c) os clientes nunca se preocuparam com essa prática.

A verdade é que os clientes não têm outro remédio senão confiar nos arranjos particulares que lhes são propostos. O que é que implica ao certo um arredondamento da taxa de juro? Eu próprio, que sou economista, nunca entendi bem o que estava em causa.

Mas nós descobrimos agora que esse expediente gerou para o conjunto dos bancos centenas de milhões de contos adicionais por ano. Ou seja, catrapiscando aqui e acolá umas dezenas de euros, os bancos inflacionaram desmesuradamente os seus lucros. Chama-se a isto abuso de confiança.

Ora isto assemelha-se estranhamente àquela fraude bancária que consiste em tirar de cada conta todos os meses 5 cêntimos. Ninguém dá por nada, mas o gatuno fica rico.

Estamos, por conseguinte, perante uma viragem fundamental nos mercados financeiros portugueses. A partir de agora, os bancos não mais poderão tomar por adquirida a confiança dos seus clientes, porque todos nós vamos espiolhar com muito mais atenção todas as condições que eles nos propõem.

Resultado: a concorrência efectiva vai aumentar e as margens vão baixar. Não acreditam? Estejam atentos, e verão.

Ora bem, estando as coisas neste pé, a gente descobre que há pelo menos um banco - refiro-me ao BPI - que, durante todo este tempo, se comportou de forma exemplar, não cobrando aos seus clientes nem um cêntimo a mais.

Uma boa surpresa, evidentemente. A minha empresa é cliente do BPI, e eu fiquei contente por saber isso.

Seria de esperar, nestas circunstâncias, que o BPI tirasse partido da situação. De pouco vale ter-se um comportamento eticamente louvável se ninguém souber disso.

Pois que fez o BPI? Lançou uma campanha em que afirma que os seus clientes fazem as contas, e por isso o preferem aos outros.

Parece-me isto um erro de perspectiva. Como cliente, o que ambiciono é não ter que fazer as contas. O que eu espero é poder confiar que as recomendações que o meu banco me apresenta estão correctas porque, tendo ele feito as contas que eu não posso ou não quero fazer, concluiram que elas são as melhores para mim.

Por isso, o que o BPI deveria antes dizer é que os seus clientes não precisam de fazer as contas. Porque nele é possível confiar-se.

Mais um erro de planeamento estratégico.

15.11.06

Para que servem os estudos

Boa parte das vezes, para manter ocupadas as empresas que os fazem. Pelo menos é o que me ocorre, ao ler estas grandes novidades, resultantes de um estudo publicado hoje no M&P.

14.11.06

Um conto de Natal

Se bem entendi a notícia publicada no Meios e Publicidade, no Reino Unido há consumidores a acusar certas campanhas de serem publicidade enganosa. O motivo: querem fazer crer às criancinhas que não existe o Pai Natal.

Dava um bom enredo para um filme da época, não dava? O menininho sardento, filho de pai bêbado e mãe demitida pelo WalMart, convence o advogado cínico e falido a recuperar os seus ideais, processando as grandes corporações que andam a anunciar tamanha mentira. No fim, o juiz manda o Pai Natal voltar aos anúncios (dando emprego ao avô do menino, que é obeso e fica perfeito na personagem), o advogado barbeia-se, a mãe casa com ele e vão todos comemorar no shopping.

Pois é, quem diria. O Pai Natal, o mais bem sucedido dos mitos publicitários, durante 200 anos foi tão real como a infância. Agora que já não precisam dele, que já não ajuda tanto a vender, querem que acreditemos que afinal nunca existiu? Estes publicitários são uns aldrabões.

10.11.06

Formas simples de aumentar a produtividade nacional

Quando se resolve desistir de um projecto, avisar imediatamente do facto as empresas às quais foram solicitadas propostas, em vez de obrigá-las a continuarem inutilmente a fazer chamadas de follow-up durante meses.

É impressionante o tempo e o dinheiro que se perde apenas porque tantas pessoas não têm a frontalidade de escrever um simples email a dizer: "Não".

Não está certo abusar da credulidade da juventude



O que é o contrário do amarelo? O que é o contrário de tirar um curso de medicina? O que é o contrário de escrever um livro?

Tantas perguntas. Nenhuma resposta.

Quando alguém nos aconselha: "Whatever you think, think the opposite", que espécie de conselho está a dar-nos ? Poderemos tomá-lo a sério?

Será que Paul Arden fez um livro ao contrário quando fez o seu?

Vejamos.

Os best-sellers da literatura de negócios têm todos um certo número de coisas em comum:

1. Assentam numa ideia muito simples, usualmente trivial;

2. Escarrapacham-na na capa de uma forma apelativa para pessoas preguiçosas ou ignorantes, que anseiam ter êxito sem precisarem de se esforçar muito na vida;

3. Têm pouco texto, composto com letras muito grandes e organizado em parágrafos telegráficos;

4. Fogem a raciocínios complicados;

5. Repetem ad nauseam as mesmas ideias (?) simples recorrendo a uma mão cheia de historietas;

6. Descem ao nível de compreensão de qualquer analfabeto;

7. Enchem o livro de bonecos que incentivam os curiosos a folhearem-no.

Será que Paul Arden fez o contrário disto?

No way! Pelo contrário, esforçou-se por levar até ao limite esta lógica que comprovadamente agrada a mentecaptos e assegura o sucesso editorial a qualquer autor da treta.

Em Inglaterra, um livro deste não faz muito mal, porque os jovens aprendem nas escolas a trabalhar a sério. Um bocadinho de desbunda até pode ajudar a desformatar espíritos excessivamente condicionados.

Entre nós, porém, é desastroso. Porque por cá abunda o talento, mas fazem falta o pensamento disciplinado e o profissionalismo. Receitas que prometem felicidade sem dor são aceites acriticamente por se adequarem tão bem à mentalidade supersticiosa reinante.

A questão não é, acreditem-me, fazer meramente ao contrário, é diferenciarmo-nos de forma significativa e relevante. E, para isso, é preciso começar por aprender muito, trabalhar muito e pensar muito.

5.11.06

Os lados do CCP

Esta semana desenrolou-se na minha Inbox a campanha para a direcção do clube dos criativos. A lista B, muito convicta no seu papel de oposição, desafiou aguerridamente a lista A. Esta, um pouco contrariada, respondeu defendendo a obra feita e prometendo continuidade. Com a vitória da lista A, “o lado B” voltou a cumprir a sua parte no ritual democrático e deu os parabéns aos vencedores – não sem os alfinetar mais uma vez com a sua lista de reivindicações. Ao que contra-alfinetou a presidente eleita, num tom matreiro entre o "vamos lá fazer as pazes" e o “toma, que a última palavra é minha”.

Tudo isto pareceu-me saudável e muito bem-vindo, particularmente por nunca ter havido no CCP. Haver uma só lista era mau sinal. Haver duas já mostra que o clube interessa a alguém. As farpas de parte a parte, que não sei se foram de coração ou só show off, fazem parte do jogo. Eu, que votei na lista B, poderia tranquilamente ter votado na outra: acho que o trabalho feito, mesmo não sendo suficiente para ter o clube a funcionar como todos gostaríamos, já é admirável.

Mesmo assim votei nos do “lado B”, e principalmente por uma razão. Obviamente concordo com o que querem para o clube, mas concedo à actual direcção que é bem mais fácil falar do que fazer tudo aquilo acontecer. O que para mim mais pesou é que, sem o email com que a lista B abriu as hostilidades, eu não teria sequer sabido que havia eleições. Isto apesar de ser sócio, de me interessar pelo clube e de ter os contactos actualizados.

E pelos vistos não fui o único a não saber de nada: no comunicado pós-derrota da lista B, o Ricardo Miranda informava que o total de votos foi de 52!

Não sei quantos sócios tem actualmente o CCP, mas esse número foi o que mais me surpreendeu. Com uma taxa de participação tão baixa, é natural que seja difícil à direcção do clube realizar qualquer coisa. Assim, proponho que a direcção reeleita defina desde já este objectivo para o seu novo mandato: conseguir que nas próximas eleições haja muito mais eleitores. Sem isso, seja qual for o lado vencedor, o Clube de Criativos não vai a lado nenhum.

2.11.06

Admirável mundo novo

Quando se fizeram os primeiros anúncios de televisão cada spot durava meia hora.

À medida que o espaço foi encarecendo os spots foram encolhendo e os publicitários aprenderam a telegrafar mensagens em cada vez menos tempo.

Até que chegámos aos frenéticos dias de hoje em que uma cadeia americana de estações de rádio começou a vender blocos de 1, 2 e 5 segundos.

Haverá compradores? É possível comunicar alguma coisa em tão pouco tempo?

Os placards colocados nos estádios de futebol limitam-se a exibir os nomes das marcas que os pagam. Ora, em 2 segundos é possível dizer-se "Coca-Cola". Mas também é possível comprar-se 30 espaços de 2 segundos para passarem durante 1 hora e usá-los para repetir 30 vezes "Coca-Cola".

E isso serve para alguma coisa?

Se se trata de sustentar a presença de uma marca já implantada no mercado, é possível que sim. Além disso, é possível imaginarem-se soluções menos óbvias, mas ainda assim irritantes, tais como o recurso a micro-jingles ou a um brevíssimo slogan identificativo da marca.

Mas a repetição ad nauseam também poderá ser útil, se acompanhada de outros suportes, para impor uma nova marca.

E, segundo o professor Schmittlein da Universidade de Wharton, ainda há a possibilidade de deixar uma frase a meio e deixar que a audiência a complete: "Novidades?"

Decididamente, hoje estou num dia optimista.

31.10.06

A democratização da inovação



Há uns bons trinta anos que Eric von Hippel insiste na importância da inovação iniciada e desenvolvida pelos clientes e utilizadores.

A sua tese é facilmente aceite no que respeita aos mercados businness-to-business, mas menos valorizada nos mercados de bens de consumo.

No entanto, a Coca-Cola sob a forma em que hoje a conhecemos foi inventada por consumidores que decidiram misturar o xarope à venda nas farmácias com água gaseificada. O automóvel descapotável foi inventado por condutores que experimentaram serrar o tejadilho. O micro-computador foi inventado por estudantes de informática que desejavam ter capacidade de cálculo em suas casas. A World Wide Web foi inventada por um investigador do CERN insatisfeito com os interfaces disponíveis para buscar informação na internet. E assim sucessivamente.

Von Hippel cita uma interessante investigação levada a cabo pela 3M. Segundo ela, as inovações desencadeadas pelos clientes produziram oito vezes mais vendas do que as inovações iniciadas dentro de casa. Mais: as inovações dos clientes conduzem mais frequentemente a novos produtos e novos negócios, ao passo que as outras traduzem-se usualmente em simples aperfeiçoamentos incrementais do que já existe.

No seu novo livro "Democratizing Innovation", Von Hippel mostra que as tecnologias da informação aumentaram radicalmente a capacidade de inovação dos clientes, conduzindo à democratização do processo. Cada vez mais, os clientes cooperam entre si para desenvolverem produtos e serviços mais adaptados às suas necessidades particulares e para os disseminarem uma vez inventados e testados.

Também aqui encontramos, por conseguinte, um exemplo do crescente poder dos clientes face aos produtores. Que podem estes últimos fazer para não perderem inteiramente o barco?

Von Hippel sugere três estratégias:

1. Disseminar em larga escala as inovações introduzidas pelos clientes e colaborar na sua melhoria;

2. Vender aos utilizadores produtos e software destinados a facilitar o processo de inovação;

3. Vender produtos e serviços complementares das inovações desenvolvidas pelos clientes.

28.10.06

Sobre o declínio do marketing

Quando se discute o estado das relações entre os anunciantes e as agências esquece-se usualmente que ele é sobre-determinado pelo estado geral do marketing.

Ora acontece que, desse lado, as notícias não são boas. Um artigo (*) publicado há um ano na Sloan Management Review (a revista de gestão do MIT), assinado por Frederick Webster, Alan Malter e Shankar Ganesan, sustenta que o estatuto do marketing tem vindo a descer nas empresas norte-americanas. Creio que isso é verdade um pouco por todo o mundo.

Segundo os autores, os gestores de topo dão cada vez mais importância a funções como as finanças e as operações em detrimento do marketing, designadamente na sua dimensão estratégica.

Por um lado, o marketing foi expulso do centro corporativo, arrastado pelo declínio geral das preocupações estratégicas e de longo prazo. Por outro lado, ao nível funcional, o marketing encontra-se frequentemente remetido para a organização de acções promocionais e a negociação com os canais retalhistas.

Num certo sentido, voltou-se à situação que prevalecia antes dos anos 50 do século passado, com a óptica de vendas, mais preocupada com a obtenção de resultados no curto prazo, a sobrepor-se à orientação de marketing, mais preocupada com a construção de marcas fortes. A dificuldade de documentar com resultados sólidos o valor estratégico da filosofia de marketing levou a um retrocesso acentuado das práticas de gestão.

Pressionados para incrementar vendas e reduzir custos de qualquer maneira, os gestores de marketing passaram essa pressão para os seus parceiros, entre os quais se encontram as agências de publicidade.

Pense-se o que se pensar desta situação, é nela que presentemente temos que viver.

(*) F. Webster, A. J. Malter e S. Ganesan, “The Decline and Dispersion of Marketing Competence”, Sloan Management Review, Summer 2005, Vol. 46, Nr 4, pp. 35-43 (foi publicada uma tradução razoável na Revista Portuguesa e Brasileira de Gestão, Jul/ Set 2005).

Estratégia, precisa-se

A campanha dos óleos VG é engraçada, sim senhor.

Mas eu pergunto: o que é que leva alguém a pensar que aquilo haverá de ter algum interesse para as donas de casa que compram o raio do óleo?

Fazem-se hoje demasiadas campanhas publicitárias concebidas para agradar acima de tudo aos publicitários, como se os publicitários tivessem interesses, atitudes e motivações semelhantes às do público a que elas supostamente são dirigidas.

Uma das principais qualidades que um bom publicitário deve ter é a capacidade de se pôr na pele de pessoas que pela sua ocupação e concepção de vida são muito diferentes dele. Chama-se a isso criar empatia com o público.

Eu sei que isso é muito difícil num país onde as supostas elites desprezam a massa dos seus concidadãos, que elas consideram irremediável e definitivamente estúpida.

Mas - que querem? - ninguém é obrigado a escolher esta profissão.

26.10.06

Armadilhas da pesquisa

Há uns anos atrás aconteceu-me ser frequentemente inquirido para o painel de opinião da SIC, uma enriquecedora experiência que me pôs a pensar sobre o que é afinal isso da opinião.

Duas constatações em particular me deixaram perplexo. Em primeiro lugar, embora eu seja em geral considerado um sujeito por vezes incomodativamente opinativo, pude constatar em vários momentos que não tinha de facto qualquer opinião sobre certas questões que me colocavam. Em segundo lugar, a avaliar pelos resultados divulgados, ao contrário de mim (pelo menos na aparência) a esmagadora dos inquiridos manifestavam preferências muito bem definidas por uma das alternativas que lhes eram propostas.

Uma das explicações possíveis para esse fenómeno será que, embora as pessoas não pensem seriamente sobre muitos assuntos, optam por dizer algo que lhes parece socialmente aceitável (ou recomendável) quando insistentemente pressionadas a dizer qualquer coisa, para não sentirem que estão a fazer figura de ignorantes. Naturalmente, isto acentuou as minhas suspeitas em relação à validade de muitas sondagens que vemos para aí publicadas.

Num artigo esta semana saído no Público e que pode ser lido aqui, o Pedro Magalhães debruça-se sobre este fenómeno. Consola-me saber que ele já foi estudado em profundidade. Preocupa-me que o veredito final de John Zaller, um investigador que sobre ele se debruçou, tenha sido este: a maior parte das pessoas não têm verdadeiras opiniões sobre seja o que for, mas apenas "predisposições" e "considerações", sendo relativamente fácil manipular as suas respostas fazendo variar muito ligeiramente o modo como as perguntas são feitas. Para ficarem a saber o que isso quer dizer e entenderem melhor as consequências dessa descoberta, leiam o artigo do Pedro.

Entretanto, acredito que toda a gente que trabalha em marketing e publicidade deveria estar prevenida contra as consequências eventualmente devastadoras de se retirarem conclusões abusivas de pesquisa efectuada sem ter em conta estes fenómenos perversos. Verdade verdadinha, há por aí demasiada pesquisa, nomeadamente qualitativa, em que os respondentes são barbaramente torturados até dizerem aquilo que se quer que eles digam.

A boa pesquisa tem tanto de arte como de ciência. Além disso, só pode produzir resultados fidedignos quando quem a faz está genuinamente interessado em aprender algo e não em impor a todo o custo os seus preconceitos a priori. Não posso deixar de recordar a prevenção de David Ogilvy contra aqueles que usam a pesquisa como os bêbados usam os candeeiros: "for support, rather than for enlightenement".

20.10.06

Anunciantes e agências

Na semana passada moderei, a convite da APAN, um seminário em que anunciantes e agências fizeram o ponto do estado do seu relacionamento mútuo.

As agências fizeram-se representar por uma luzida embaixada. Os anunciantes idem, mas compareceram em número inferior ao que seria de esperar.

O debate foi muito interessante, pelo menos para mim. Tenciono escrever nos próximos dias alguns posts sobre o que ouvi e pensei durante e depois dele.

18.10.06

Modelo de negócio do YouTube

A ler: Wharton sobre o modelo de negócio do YouTube.

17.10.06

Tudo o resto me parece saloio

Hoje descobri, por puro acaso, quando preparava uma apresentação, o site do Neil French.

Se calhar fui o último. Ainda assim aqui fica a recomendação: sem querer ofender ninguém, ao lado do trabalho dele, tudo o resto me parece saloio.

15.10.06

A missa ao vigário

Vale a pena ouvir esta palestra de Seth Godin no Google. Como o próprio diz, é como ensinar a missa ao vigário. Mas não é que ele ensina umas coisas?

14.10.06

Prazos

Não sei quem é o autor, mas este Dicionário que alguém me enviou por email também merece ser adoptado deste lado do Atlântico (afinal, a história do país irmão sempre tem algum fundamento). Vai ser muito útil a quem tem que lidar com os prazos (ou deadlines, como agora dizemos) de fornecedores, clientes-que-têm-que-aprovar-a-campanha e, principalmente, clientes-que-têm-que-assinar-o-cheque.

Passo a citar.

"Para evitar que estrangeiros fiquem pegando injustamente no nosso pé, está sendo compilado o Dicionário Brasileiro de Prazos (que já deveria estar pronto, mas atrasou ...), do qual foram extraídos os trechos a seguir:

DEPENDE: Envolve a conjunção de várias incógnitas, todas desfavoráveis. Em situações anormais, pode até significar sim, embora até hoje tal fenômeno só tenha sido registrado em testes teóricos de laboratório. O mais comum é que signifique diversos pretextos para dizer não.

JÁ JÁ : Aos incautos, pode dar a impressão de ser duas vezes mais rápido do que já. Ledo engano; é muito mais lento. "Faço já" significa "Passou a ser minha primeira prioridade", enquanto "Faço já já" quer dizer apenas "Assim que eu terminar de ler meu jornal, prometo que vou pensar a respeito".

LOGO: "Logo" é bem mais tempo do que dentro em breve e muito mais do que daqui a pouco. É tão indeterminado que pode até levar séculos. Logo chegaremos a outras galáxias, por exemplo. É preciso também tomar cuidado com a frase "Mas logo eu ?", que quer dizer "Tô fora".

MÊS QUE VEM: Existem só três tipos de meses: aquele em que estamos agora, os que já passaram e os que ainda estão por vir. Portanto, todos os meses, do próximo até o Apocalipse, são meses que vêm!

NO MÁXIMO: Essa é fácil: quer dizer "no mínimo". Exemplo: Entrego em meia hora, no máximo. Significa que a única certeza é de que a coisa não será entregue antes de meia hora.

PODE DEIXAR: Traduz-se como "nunca".

POR VOLTA: Similar a "no máximo". É uma medida de tempo dilatada, em que o limite inferior é claro, mas o superior é totalmente indefinido. "Por voltadas 5h" quer dizer "A partir das 5 h".

SEM FALTA: É uma expressão que só se usa depois do terceiro atraso. Porque depois do primeiro, deve-se dizer "Fique tranqüilo que amanhã eu entrego". E depois do segundo, "Relaxa, amanhã estará em sua mesa". Só aí é que vem o "Amanhã, sem falta".

UM MINUTINHO: É um período de tempo incerto e não sabido, que nada tem a ver com um intervalo de 60 segundos e raramente dura menos que cinco minutos.

CHIIII...: Se dito neste tom, após a frase: "Não vou mais tolerar atrasos, OK?", exprime dó e piedade por tamanha ignorância sobre nossa cultura.

ZÁS-TRÁS: Palavra em moda até há uns 30 anos atrás e que significava ligeireza no cumprimento de uma tarefa, com total eficiência e sem nenhuma desculpa. Por isso mesmo, caiu em desuso e foi abolida do dicionário."

5.10.06

Band Aid


É um livro que está na moda. Daqueles que, mal é mencionado numa roda de conversa, põe toda a gente a dar opiniões – até vir um desmancha-prazeres perguntar se alguém de facto o leu. Pois, olhe, ainda vai a tempo. Vale mesmo a pena.

The tipping point articula com clareza uma teoria simples (ainda que, como vinca o próprio autor, nada intuitiva) de como se propagam os mais diversos comportamentos sociais. Os exemplos vão do suicídio entre adolescentes à Rua Sésamo, da compra de discos por catálogo ao crime. Em cada caso, o ponto comum é sempre uma propagação não linear, com um ponto de viragem a partir do qual o comportamento em causa dá ou não origem a uma “epidemia”.

As implicações para o marketing são enormes – e estão explícitas no livro. Alguns dos exemplos são mesmo de “epidemias” criadas ou simplesmente aproveitadas por marqueteiros – como a moda dos Hush Puppies nos anos 90, ou a forma como Lester Wunderman ajudou o Columbia Record Club a vender mais discos.

Obviamente o livro não traz nenhuma receita pronta, mas uma forma nova de procurar aquilo que define qualquer estratégia: o ponto sobre o qual agir para obter o máximo resultado com o mínimo esforço. Os seus “tipping points” são isso mesmo. Para Malcolm Gladwell, a resposta pode estar numa mensagem particularmente contagiosa (é normalmente aí que os publicitários se concentram); pode estar num certo tipo de mensageiros, capazes de retransmitir a mensagem melhor do que o comum dos mortais; ou na procura do contexto adequado.

Não surpreende que, na sua Conclusão (“Focus, test and believe”) Gladwell acabe por preconizar soluções cirúrgicas, mais próximas da guerrilha do que da artilharia pesada. Diz ele: “A critic looking at these tightly focused, targeted interventions might dismiss them as Band-Aid solutions. But this term should not be considered a term of disparagement. The Band-Aid is an inexpensive, convenient, and remarkably versatile solution to an astonishing array of problems. (…) The Band Aid solution is actually the best kind of solution because it involves solving a problem with the minimum amount of effort and time and cost”.

26.9.06

O que é a responsabilidade social das empresas

Durante a transmissão da Meia Maratona de Lisboa, os responsáveis de marketing das inúmeras empresas patrocinadoras explicaram invariavelmente o seu apoio ao evento como uma manifestação de responsabilidade social.

Afirmaram estarem ali porque promover o desporto é uma causa nobre, porque os deficientes também direito a praticá-lo, porque o atletismo ajuda os jovens a ocuparem meritoriamente os seus tempos livres, porque a maratona fomenta o turismo - enfim, por uma variedade de causas filantrópicas de interesse público.

O economista Milton Friedman tem uma opinião muito negativa sobre tudo isto. A única responsabilidade de uma empresa perante a sociedade, defende ele, consiste em oferecer ao mercado produtos decentes e em gerar lucros para os accionistas. Tudo o resto é não só supérfluo, como, em última análise, uma manifestação de irresponsabilidade.

Terá ele razão? Considerando o despropósito com que hoje se invoca a responsabilidade social, quase me sinto tentado a afirmar que sim.

De facto, pergunta-se: com que critério deverá uma empresa assumir que é socialmente responsável por apoiar o combate à toxidependência e não, por exemplo, por financiar a prevenção da SIDA? Qual é o motivo para optar por uma causa em detrimento da outra?

Mais ainda: quais os limites da responsabilidade social das empresas? Não deveriam elas, para minimizar o desemprego, contratar trabalhadores de que, efectivamente, não precisam? Ou para serem mais úteis à sociedade, lançar produtos benfazejos (como, por exemplo, medicamentos) que todavia dão prejuízo? Como é evidente, a lista de possíveis áreas de intervenção empresarial em prol do bem-estar social não tem fim.

Por mim, acredito que a responsabilidade social é um conceito importante, mas usualmente mal entendido e pior aplicado.

Quando, há cerca de duas décadas, a Johnson & Johnson foi confrontada com a morte por envenenamento de várias pessoas após terem ingerido Tylenol, rapidamente se apurou que a tragédia se devera à acção de um anónimo criminoso psicopata que injectara cianeto nas cápsulas nos supermercados onde o medicamento de encontrava à venda.

A reacção da Johnson & Johnson foi, a meu ver, um exemplo de responsabilidade social. Em vez de sacudir as culpas para cima dos retalhistas, a empresa aceitou indemnizar as famílias das vítimas, recolheu todas as embalagens distribuídas e garantiu que, de futuro, o produto só estaria à venda em estabalecimentos capazes de garantir a inviolabilidade dos blisters.

Assim, responsabilidade social significa antes de mais assumir a responsabilidade pelas eventuais consequências negativas que possam decorrer da actividade de uma empresa ou da utilização dos seus produtos. Um fabricante de celulose tem a obrigação de se esforçar continuamente por reduzir ou eliminar o impacto da poluição que provoca sobre o meio ambiente. Um fabricante de automóveis tem a responsabilidade de velar pelas condições de segurança dos veículos que comercializa. Um canal de televisão tem a responsabilidade de proteger os seus telespectadores infantis de eventuais tentativas de manipulação publicitária.

Por outras palavras, as áreas prioritárias de preocupação social de uma empresa devem ser aquelas em que se manifestam as externalidades negativas inerentes à sua actividade. Convém não confundir isto com o recurso aos patrocínios como forma de comunicação institucional ou de marketing, visto tratar-se de um tema completamente distinto.

Resumindo e concluindo, voto a favor da responsabilidade social como preocupação relevante das empresas, mas voto contra iniciativas sem estratégia nem sentido evidente que se acoitem à sombra dessa designação.

Quod erat demonstrandum

"O objectivo do programa de fidelização é fidelizar os clientes e angariar novos" (sic)

(Retirado de um comentário do Henrique ao meu post Novos e velhos.)

25.9.06

Experiência

Ao contrário de muitas outras pessoas, a quem chamarei bem-aventuradas, eu penso que o panorama publicitário português raramente foi tão pobre como agora.

De modo que, no presente estado de coisas, fico muito comovido quando me deparo com uma campanha realmente bem pensada e executada. Ainda não cheguei ao ponto de chorar, mas já faltou mais.

Os meus parabéns à BBDO pela Experiência Optimus.

22.9.06

Há vida para lá do Sol? O depoimento de um alienígena

Ser um brasileiro há muito tempo em Portugal dá-me a escolha entre o olhar do aculturado e o do estrangeiro.

Nesta celeuma do Expresso e do Sol, é o meu olho estrangeiro que não pára de se espantar. Programas de televisão, polémicas na rádio e em blogs, conversa acalorada nos cafés. Nunca pensei que o lançamento de um semanário e a oferta de uns DVDs pelo concorrente desse para tanto. Por aqui, a série de posts do João sobre o tema provocou, nos modestos parâmetros deste blog, um record de audiência.

Digo que é o meu olho estrangeiro que se espanta porque nunca me habituei realmente a esta coisa totalmente portuguesa do semanário. Desde a adolescência fui educado para ler jornais (que saem todos os dias) ou revistas (que saem uma vez por semana). Quando cheguei a Portugal ainda não havia o Público, o Diário de Notícias era perfeitamente ilegível e não havia revistas de informação. Mas havia o Semanário, o Independente tinha acabado de aparecer e, lá no alto do seu Olimpo, o Expresso.

A consequência disso foi que, durante um ano e tal, até o surgimento do Público, embora até gostasse do Independente daquele tempo, senti-me órfão em matéria de informação. “Órfão” não é exagero. Como toda esta polémica mostra, os jornais são provavelmente a categoria, a par dos cigarros, em que o hábito tem mais força. Mas não é um hábito anódino. É um verdadeiro ritual que nos estrutura a vida, a sociabilidade e o sentido de pertença. Tem qualquer coisa de religioso, como ser adepto de um clube de futebol. Por isso o desafio ao Expresso, ao qual eu, por exemplo, permaneci estrangeiro, deu origem entre adeptos e não-adeptos a reacções tão emocionais – incluindo a do próprio Expresso, como o João já demonstrou. A intenção declarada de desalojar um traço de identidade tão sagrado da classe média portuguesa equivale a um golpe de estado.

No Público de ontem vinha uma crónica do Eduardo Prado Coelho intitulada “Expresso”. Mas não falava do Expresso: autobiografava o autor enquanto leitor do Expresso. Quando e onde começou a ler, com quem o foi lendo ao longo da vida, sentado no chão em Paris ou no café com a mulher e os amigos. Até a torturada questão de saber se o jornal é “de direita” ou “de esquerda” – ou seja, a que tribo implicitamente me filio quando o leio –, que, para mim, ainda estrangeiro nesse aspecto, está sujeita a subtilezas locais de interpretação que até hoje não domino totalmente, mostra a que ponto o ritual do jornal tem associações viscerais.

Se alguma coisa o Sol fez bem, foi cavalgar esse hábito tão enraizado do semanário e disputar um lugar ao lado do Expresso. Mas, por muitos erros de marketing que o concorrente cometa, reconstruir uma ligação emocional tão funda como a do Expresso com os seus adeptos não será propriamente fácil.

21.9.06

Experimentação, repetição e fidelização

O Hidden sugere aqui que o que cria fidelidade a um produto é a sua experimentação. E prossegue:
A consequência da experimentação de um produto pode ser positiva ou negativa. Se for positiva, esta experimentação resultará numa repetição da compra do produto (vamos a caminho da "afamada" fidelização do consumidor). Se a experimentação for negativa, o produto deixa automaticamente de fazer parte das escolhas do consumidor.

A última afirmação está fundamentalmente correcta - o desagrado pode levar à eliminação definitiva da marca do leque de escolhas - mas a primeira não. A pesquisa existente mostra que, mesmo quando a experimentação satisfaz, na grande maioria das ocasiões não ocorre repetição de compra. Logo, o que podemos dizer é que uma experiência satisfatória é condição necessária, mas não suficiente, para a fidelização.

Porque é que as coisas se passam assim? Possivelmente porque a rotina é um factor decisivo para explicar os comportamentos de compra. Só níveis excepcionais de agrado conduzem automaticamente à incorporação de uma nova marca no reportório de marcas habitualmente adquiridas. Caso contrário, o consumidor reverte para o seu comportamento habitual.

Acredita-se hoje que uma das principais funções da publicidade consiste precisamente em recordar as experiências positivas, estimulando, por essa via, a repetição de compra.

Decorre daqui que a boa e velha publicidade é um instrumento mais eficaz de fidelização do que os impropriamente chamados programas de fidelização. E esta, hã?

Novos e velhos

A questão de saber se a intenção do Expresso era conquistar leitores ou reter os que já tinha provavelmente não tem resposta.

Na minha experiência, a grande maioria dos gestores de marketing não é capaz de decidir entre uma coisa e outra quando se propõe lançar uma campanha de publicidade ou organizar uma promoção.

20.9.06

O que marketing quer dizer

Dando aí uma volta pelos blogues, a gente apercebe-se de que o Expresso não é um semanário muito apreciado. Esse facto é relevante, porque:

1. Os bloggers são consumidores intensivos de jornais e revistas

2. Os bloggers dispõem de uma razoável capacidade de influenciar a opinião

3. Os bloggers reflectem a opinião de largos círculos de leitores

Logo, a antipatia dos bloggers pelo semanário de Pinto Balsemão reflecte, com grande probabilidade, uma atitude muito difundida na opinião pública cultivada, que é aquela que se interessa pela imprensa escrita.

A realidade é que, de há uns anos a esta parte, o Expresso tem vindo a diminuir de qualidade, o que inevitavelmente se traduziu numa perda de leitores. Na minha opinião, degradou-se tanto que é hoje humilhante a comparação entre o Expresso e os principais jornais de referência de outros países europeus.

Podemos considerar que cada país tem os jornais que merece. Ou podemos acreditar que os jornais podem desempenhar um papel decisivo para ajudar a tornar os países um bocadinho mais evoluídos.

A meu ver, todos temos interesse em que a imprensa escrita cumpra cabalmente o seu papel civilizador. Por isso, todos temos interesse em que o Expresso seja melhor.

Aparentemente, os proprietários do Expresso estão convencidos de que o seu anterior Director era um obstáculo à melhoria do produto. Seria de esperar que, concretizada a mudança de Direcção, se assistisse a um esforço sério para adaptar o jornal aos desejos dos leitores.

Em vez disso, temos assistido a mudanças pouco mais do que cosméticas e a manobras promocionais cuja estridência denuncia algum desespero. Ora, do que o Expresso antes de mais necessita é de se convencer que tem que dar ouvidos aos consumidores de jornais. Ou seja, necessita de fazer pesquisa de mercado a sério e de se preparar para repensar o seu posicionamento e para reformular em profundidade o produto que todas as semanas coloca nas bancas.

Em síntese, precisa de fazer marketing a sério.

19.9.06

Os jornais e a publicidade

A publicidade ao lançamento do Sol é tão feia que até dói. Como tendemos a evitar olhá-la, quase passa despercebida a inépcia do seu conteúdo. Mas a verdade é que desta campanha se encontram ausentes toda e qualquer promessa de valor, todo e qualquer posicionamento, toda e qualquer ideia criativa relevante.

Tendo em conta que uma boa parte das receitas dos jornais provêm da publicidade, seria de esperar que eles se empenhassem em valorizar o seu papel e a sua importância, a exemplo do acontece, digamos, no Reino Unido. Desse modo, contribuiriam para educar os anunciantes, elevar o nível da comunicação e prestigiar os jornais.

Se os próprios media não acreditam que a publicidade funciona, quem irá acreditar?

Réplica

Li com interesse os dois comentários ao último post. O que penso é o seguinte:

1. Não se espera que os portugueses comprem dois semanários, caro hidden. Espera-se que comprem um semanário por 2 € e um DVD por 2,80 €, porque, ao contrário dos estrategas de marketing do Expresso, os consumidores não são parvos. Eu, por exemplo, que não sou leitor do Expresso, tenciono comprá-lo enquanto continuarem a oferecer-me os DVDzinhos.

2. Se a ideia fosse fidelizar em vez de travar a experimentação, a promoção do Expresso teria começado depois do lançamento do Sol, não antes. Além disso, não se fidelizam clientes oferecendo DVDs. O factor crucial na repetição de compra é a satisfação do cliente, a qual depende por sua vez do conteúdo e da organização do jornal. Está mais que provado que este tipo de promoção equivale a subsidiar os consumidores que, de todo o modo, sempre comprariam o jornal, sem atrair novos clientes de uma forma permanente nem reter os antigos. Essa história da fidelização é mais complicada do que parece. (Ou será que eu deveria antes dizer: mais simples do que parece?)

18.9.06

O marketing do Expresso (2)

Findo o primeiro round, uma coisa é desde já certa: falhou, como não poderia deixar de falhar, a tentativa de dissuadir as pessoas de experimentarem O Sol. O que eu não percebo é como é que alguém tenha podido deixar-se convencer de que esse era um objectivo sensato.

Decorre daqui que o Expresso gastou inutilmente um dinheirão a oferecer DVDs grátis aos seus leitores, com a agravante de que a corrida aos pontos de venda sábado de manhãzinha de pessoas que só estão interessadas no filme, cria a muitos leitores fiéis do jornal enormes dificuldades para poderem encontrá-lo. Creio que este é um facto de observação comum.

Logo, o Expresso conseguiu simultaneamente perder dinheiro e irritar muitos dos seus melhores leitores. Genial.

O marketing foi inventado para impedir que estas técnicas de venda tão agressivas quanto desmioladas levassem as empresas a falência. Aparentemente, já ninguém se lembra disso.

6.9.06

O marketing do Expresso

1. "Basta convencer os leitores flutuantes a comprarem o jornal sempre e podemos chegar aos 140 mil", diz Henrique Monteiro, Director do Expresso. A palavra "basta" sugere uma facilidade que não existe. Se um leitor flutua, alguma razão terá para flutuar. Em todo o mundo, os leitores flutuantes de um determinado título representam uma larga fracção do total dos leitores. Se a teoria do comportamento de compra repetida está certa - e não há razões para crer o contrário - essa proporção deverá ser razoavelmente estável. Assentar a estratégia de expansão de um jornal na transformação de leitores ocasionais em leitores permanentes não é, muito provavelmente, uma boa ideia.

2. Ao que se sabe, o Expresso procurará também captar leitores mais jovens. (Eis o que pode ser classificado como um pensamento pouco original: nos tempos que correm, quase toda a gente que quer crescer decide que o melhor modo de o fazer é atrair clientes mais jovens.) Vai daí, na campanha de publicidade do Expresso, que ainda não tive a felicidade de ver, "em primeiro plano, três jovens lêem o jornal e só atrás surgem pessoas de cabelos brancos". Chega a ser comovente esta convicção de que público se deixa manipular por imagens que tão flagrantemente contrariam as percepções quotidianas. A realidade é que o facto de alguém ler um jornal como o Expresso demonstra precisamente que deixou de ser "jovem" e passou a ter as preocupações e os interesses típicos de uma pessoa madura – o que não é necessariamente um elogio. Além do mais, não entendo a fixação do marketing do Expresso nos jovens quando a população não pára de envelhecer...

3. O formato do Expresso mudará esta semana de broad-sheet para berliner. A avaliar pelos resultados positivos que essa transformação produziu noutros países, trata-se de uma aposta relativamente segura. Só por si, poderá contribuir para aumentar a circulação do jornal entre 10 a 20%.

4. Por outro lado, o preço do Expresso baixará de 3 € para 2,80 €. Mas o Sol custará apenas 2 €. Desse modo, a manobra do Expresso corre o risco de se revelar infrutífera. Em primeiro lugar, porque, apesar da descida, a disparidade entre os dois preços permanece enorme. Em segundo lugar - e esse talvez seja o factor mais importante – ao baixar o seu preço o Expresso chama a atenção para um facto de que muitos leitores poderiam levar algum tempo a aperceber-se.

5. No plano promocional, o Expresso oferecerá DVDs grátis durante as próximas oito semanas - que coincidirão, como se sabe, com as primeiras oito semanas do Sol. É óbvia a intenção de entravar a experimentação do novo jornal. Não creio, porém, que tenha sucesso. O factor determinante da experimentação é a curiosidade despertada pelo surgimento de um novo semanário. Logo, os compradores habituais do Expresso não deixarão de comprar o Expresso, mas comprarão também o Sol para verem como é.

6. Em termos gerais, e salvo melhor opinião fundamentada em estudos que desconheço, parece-me que as iniciativas de marketing do Expresso indiciam uma hiper-reacção em absoluto injustificada perante o aparecimento de um novo concorrente.

7. De facto, não se conhece até agora nenhum elemento significativo de diferenciação do Sol face ao jornal incumbente. Nessas condições, tudo indica que a simples força da inércia o condenará a ser um eterno número dois nesta categoria. O que até poderia nem ser mau, não se desse o caso de o mercado se afigurar excessivamente restrito para comportar dois concorrentes rentáveis.

24.8.06

Como fazer um cliente feliz

Em qualquer lugar do mundo, o relacionamento com o cliente, principalmente nos serviços, é uma área em que os maus exemplos são mais frequentes do que os bons.

Portugal não é excepção, nem podia ser. Uma atitude de serviço simplesmente não faz parte das tradições de um país onde os médicos nunca atendem no horário, os operadores de call center respondem às reclamações dizendo que a culpa não é deles, os vendedores das lojas deixam o cliente entrar e sair sem lhe dizer uma palavra. Ver essa atitude transformada em sistema, então, é uma raridade absoluta.

E, no entanto, há quem esteja a fazê-lo, e bem.

Hoje, por exemplo, recebi uma cartinha da Tele2. Como sou cliente há 6 meses, oferecem-me a possibilidade de marcar à borla para o número fixo que escolher. Simples assim. Sem acréscimo de assinatura e sem me pedir nada em troca.

É uma boa acção de fidelização por vários motivos:
- a oferta é útil e relevante
- o esforço para activá-la é mínimo (nada a ver com os complicados pacotes da PT)
- o motivo apresentado (é cliente há mais de 6 meses) é suficientemente racional para que o tratamento de “cliente especial” não pareça banha da cobra, como acontece tantas vezes, mas seja aceito como uma pequena mas verdadeira gratificação emocional
- é surpreendente. Como a Tele2 não me devia nada, a simpatia caída do nada marca pontos comigo
- o capital de boa vontade conquistado na carta é aproveitado para passar uma segunda mensagem, de venda de um novo serviço (o ADSL), que apanha um cliente desarmado pela oferta inicial.

Afinal, fazer um cliente feliz não é assim tão complicado. Por que será que tão poucas marcas de serviço (bancos, telecomunicações) o conseguem?

14.8.06

A publicidade segundo Nabokov

E quando o publicitário de férias pensava finalmente poder ler outras coisas...

“Tudo quanto viesse numa caixa chata de cartão com uma tampa ilustrada era de mau agouro (…) Uma família, sentada a uma mesa redonda iluminada por um candeeiro: o rapaz veste um incrível fato à marinheiro com uma gravata vermelha, a rapariga está de botinas de cordões, também vermelhas; ambos, com expressões de deleite sensual, enfiam contas de várias cores em varinhas que parecem palhas, fazendo cestinhos, gaiolas e caixas; e, com um entusiasmo semelhante, os pais meio imbecis participam no mesmo passatempo – o pai, de barba magnífica na sua cara satisfeita, a mãe de peito imponente; o cão olha também para a mesa, e pode ver-se a avó escondida ao fundo. Estas mesmas crianças hoje são adultas e cruzo-me com elas em painéis publicitários; ele, com as suas faces lustrosas e untuosamente bronzeadas, chupa voluptuosamente num cigarro ou tem na mão musculosa, com um esgar carnívoro, uma sanduíche que contém qualquer coisa vermelha (“Comei mais carne!”); ela sorri-se para uma meia que ela própria usa, ou, com um prazer depravado, deita natas artificiais sobre frutas enlatadas; e com o tempo tornar-se-ão uns velhos alegres, rosados, gulosos – e têm ainda a negra beleza infernal de caixões de carvalho numa montra decorada com palmeiras… Assim se desenvolve paralelamente a nós um mundo de elegantes demónios, numa relação alegremente sinistra com a nossa existência quotidiana; mas no demónio elegante existe sempre uma falha secreta, uma verruga vergonhosa no traseiro do simulacro da perfeição: o fascinante glutão do anúncio, a empanturrar-se de gelatina, nunca poderá conhecer os calmos prazeres do gourmet, e as suas modas (que se atrasam no painel, ao passo que nós avançamos) estão sempre um tudo nada atrás da vida real. Um dia voltarei à discussão desta nemesis que encontra um ponto fraco para bater precisamente onde todo o instinto e poder da criatura agredida parecem residir.”

Vladimir Nabokov, O dom, trad. de Carlos Leite. Lisboa, Assírio e Alvim, 2004,
págs. 23/24

5.8.06

Ambições


Não há nada como os press releases que acompanham os lançamentos de campanhas publicitárias para sabermos o que vai na cabeça dos responsáveis de marketing. E para vermos como o que lhes vai na cabeça pode estar tão longe do que as tais campanhas podem de facto conseguir.

Leio na M&P, por exemplo, que a campanha de mupis (alguns com perfume a… café) lançada pelos cafés Torrié pretende ser um “desafio quase provocatório” ao consumidor. “Queremos levar os consumidores a questionar o seu dia-a-dia", diz o responsável pela campanha. "Queremos instigar os consumidores a tornar a sua vida cada vez mais apaixonante”.

Agora olhe os mupis. Sentiu-se instigado a questionar o seu dia a dia?

3.8.06

Será?

Lá pelo quarto copo, e já inclinado aos aforismos, o meu interlocutor sentenciou:

“O problema da publicidade portuguesa é que ela é melhor do que o marketing português.

E o problema do marketing é que ele é melhor do que as empresas portuguesas”.

12.7.06

Se não vais a bem, vais a mal



O desabafo de um consumidor.

7.7.06

Receita infalível

Redigir uma boa declaração de Missão para uma empresa é muito fácil.

Basta proibir a utilização de palavras e expressões tais como "criação de valor", "stakeholders", "qualidade", "vertente", "valor acrescentado", "excelência", "sustentável", "orientação para o cliente", "competitivo", "eficiente", "dedicação", "activo estratégico", "liderança", "equipa ganhadora", "diálogo", "capital humano", "desenvolvimento social", "orientação para os resultados", "vector", "ética", "ambição", "respeito pelo ambiente" e , sobretudo, "honestidade".

(Espero não me ter esquecido de nenhuma, mas vocês têm que compreender que a conversa da treta é inesgotável.)

Experimentem, e vão ver como é fácil.

5.7.06

Theodore Levitt (1925-2006)



Ted Levitt, o professor de Harvard falecido na passada semana, não inventou o marketing moderno, mas redigiu em 1962 o seu mais eloquente manifesto (“Marketing Myopia”) e trouxe à disciplina o prestígio intelectual de que até então carecia.

Levitt foi sobretudo um inventor de ideias inovadoras e ousadas, um agitador intelectual e um polemista brihante, não um típico académico dedicado à investigação. Avesso ao dogmatismo, não hesitava em ir contra as ideias estabelecidas, mesmo quando isso implicava contrariar opiniões que ele próprio ajudara no passado a difundir.

Escreveu relativamente pouco, mas quase tudo o que escreveu deixou marcas. Em “Marketing Myopia”, mostrou que a definição do negócio é o ponto de partida da estratégia empresarial. Em “The Industrialization of Services” lançou as bases da gestão e do marketing contemporâneo dos serviços. Em "Differentiation… of Anything”, colocou a diferenciação competitiva no centro da gestão de marketing. Em “After the Sale Is Over”, lançou as bases conceptuais do Marketing Relacional. Em “The Globalization of Markets”, não só cunhou o termo globalização como antecipou com décadas de antecedência o rumo que o mundo iria tomar.

Levitt sempre impôs elevados padrões de rigor e clareza à sua própria escrita, o que o levava a reescrever e corrigir interminavelmente os seus artigos.

Durante cinco anos, entre 1985 e 1989, dirigiu a Harvard Business Review. O resultado foi a sua transformação numa publicação mais aberta aos problemas reais do mundo empresarial, mais envolvente e mais agradável de ler.

A minha frase favorita de Ted Levitt é aquela em que ele afirma que o relevo atribuído a um tema nos manuais de gestão varia na razão inversa da sua importância real para a vida prática, dando como exemplo o facto de nenhum deles nos ensinar como nos devemos comportar num almoço de negócios.

Tudo considerado, ninguém fez mais do que ele para desenvolver e prestigiar o marketing enquanto disciplina da gestão.

4.7.06

As palavras e as coisas

Gostei de descobrir que, no site institucional do Millennium BCP, se fala de "partes interessadas" em vez de "stakeholders", como é habitual no pretensioso calão de consultor que empesta os Relatórios e Contas das empresas.

Não foi só - e já não seria pouco - o respeito pela língua que o banco revela que me impressionou; mas também o facto de a atenção pelas palavras sugerir atenção pelo que elas de facto significam.

29.6.06

A língua europeia é muito traiçoeira



"Temos busca na língua local", explicou ao Diário Económico Eckard Pfeiffer, Presidente da Accoona, um motor de busca europeu desenvolvido nos EUA.

Mais nos informa que o nome da empresa tem origem numa expressão swahili que significa "não te preocupes, sê feliz".

Assim sendo, daqui envio à Accoona os meus sinceros votos de êxito em terras da Europa. Em Portugal, pelo menos, a notoriedade está garantida.

25.6.06

Novas assombrações II

A pedido do Edie Falco, que comentou o post anterior, segue a minha opinião sobre o novo enredo com leões fantasmas.

Há uns anos, numa reunião de criativos de uma multinacional, por acaso lá em Cannes, estávamos todos contritíssimos a dizer mal dos fantasmas e de quem os cria. De repente chegam notícias do Palais: um dos “nossos” directores criativos ia quase certamente ter um Leão. Ainda empolgado pela discussão em curso, o tal director criativo (de Singapura, se não me engano), que era um rapaz muito novinho e talentoso, entre radiante e ruborizado confessa: o trabalho era um fantasma, criado por uma dupla quase à sua revelia. O que fazer agora?

As opiniões dividiram-se. A maior parte de nós, incluindo o “senior management” presente, preferiu ficar-se pelos parabéns calorosos, e assobiar para o lado em relação ao que discutíamos cinco minutos antes. Mas houve quem desse a ideia de a agência devolver o prémio. Várias pessoas – eu inclusive – defenderam com força essa opção. Alguns, como o próprio e angélico premiado, puramente por razões de coerência e ética. Mas a maior parte, com o profissionalismo do Edie Falco, estava a pensar no aproveitamento mediático que se poderia tirar de um gesto tão desprendido.

E, no entanto, olhando para trás, volto a pensar que esse tipo de jogos é péssimo para as agências – mesmo que os resultados imediatos sejam esses que o Edie aplaude. As “ferramentas de mercado” a que se refere são (já que estamos no Mundial) como faltas e simulações no futebol. Se uma falta bem cavada levar a um gol da minha selecção, quero lá saber se era tudo teatro. O que importa é ganhar, ter visibilidade, e afinal é só um jogo, né?

Acontece que, mesmo descontando qualquer aspecto ético (o que levaria para uma discussão meio propensa à hipocrisia e à dor de cotovelo), para os anunciantes a publicidade não é só um jogo.

Há uns tempos houve neste blog uma discussão com o Henrique Agostinho sobre a utilidade dos prémios de publicidade. O ponto de vista dele, que é o de muitos anunciantes, era que os prémios fazem mais mal do que bem. Distorcem o mercado e dão às agências um critério errado de qualidade publicitária. Eu defendia o contrário. Acho que prémios como Cannes, com todos os seus defeitos, fazem avançar a indústria, e por isso são bons para os anunciantes. Mas era preciso que as possibilidades de fraude e manipulação em proveito exclusivo das agências, como a que salta desta história da Giovanni FCB, não fossem tão imprudentemente expostas pelas próprias agências.

A gente sabe que há hoje uma enorme relutância dos anunciantes em pagar às agências os valores que elas precisam para manter os seus níveis tradicionais de serviço. A percepção de muitos clientes é que as agências são máquinas esbanjadoras, um luxo caro demais para os tempos que correm. Os festivais, que não são baratos, fazem parte desse suposto esbanjamento. Se as histórias que circulam sobre eles não reforçam a sua utilidade para os anunciantes, mas ao contrário o seu lado extravagante, narcisista, um jogo cintilante cheio de “ferramentas de mercado” de legitimidade duvidosa, a prazo as agências estão a dar um tiro no pé.

22.6.06

Mais assombrações

Não passa um ano sem que o festival de Cannes seja assombrado por mais uma história de fantasmas.

21.6.06

Eles andam aí

Há uma revolução em curso na comunicação de marketing. Uma revolução tão discreta, e de aparência tão inofensiva, que desconfio que a maior parte das agências de publicidade e marketing directo nem sequer deu por ela.

É a revolução dos links patrocinados. Com esses pequenos anúncios, modestos como os classificados dos jornais, todas as possibilidades do marketing directo, mesmo as mais sofisticadas, estão ao alcance de qualquer anunciante. E qualquer é mesmo qualquer: a mercearia do bairro, o fotógrafo de casamentos e o contabilista da margem sul já podem optimizar headlines em função dos resultados de split tests, comparar taxas de resposta ou taxas de conversão e comunicar de forma relevante com diferentes segmentos de mercado, tudo com uma precisão que a maior parte dos grandes anunciantes nem sonha ser possível. E tudo isso com um investimento irrisório, em comparação com publicidade "normal", investimento cujo retorno, de resto, pode ser avaliado a cada passo.

Não admira que os primeiros a aderir a essa ferramenta tenham sido pequenas empresas, ou pelo menos empresas que sempre se preocuparam muito mais com as vendas puras e duras do que com a criação de marcas e outras modernices do género. Mas agora já não é assim: marcas como a Optimus, a Cofidis, o Sapo, o Citibank já aderiram aos quadradinhos. E o natural é que comecem a comparar os resultados totalmente mensuráveis que vão tendo aí com as ferramentas que nós, publicitários “tradicionais”, lhes oferecemos. É caso para estarmos atentos.

19.6.06

Afinal é verdade

Se fôssemos julgar pelos constantes aumentos dos investimentos publicitários "a preços de tabela", a muito profetizada diminuição da importância da televisão pareceria uma tendência distante, a que o mercado português não liga a mínima. Mas de vez em quando lá aparece alguém, como a Marktest, citada hoje no Meios e Publicidade, a confirmar que, sim senhor, até os portugueses andam a ver menos televisão.

15.6.06

Não se pode ter tudo



Soube pelos jornais que a Nestlé resolveu mexer no logo que identifica os seus iogurtes numa tentativa de dar maior saliência à marca.

Compreendo bem o problema, dado que, em exercícios que por vezes realizo com os meus alunos, repetidamente constato a reduzida notoriedade espontânea da Nestlé enquanto marca de iogurtes - muito abaixo do que a sua taxa de penetração faria prever.

Mais especificamente, é raríssimo alguém associar a marca Nestlé a iogurtes. Às vezes é mencionada Sveltesse, uma sub-marca da Nestlé, outras, ainda a Longa Vida, que a empresa comprou há longo tempo e hesita em eliminar definitivamente.

Fala-se hoje muito das vantagens das marcas umbrella, ao ponto de a Unilever ponderar vir a usar também o nome da empresa como marca para o consumidor associada às familiares Skip ou Vaqueiro. O mais atraente nesta opção é a possibilidade de aumentar a eficiência da publicidade, dado que todos os produtos de um dado portfolio, mesmo os mais insignificantes, beneficiam da projecção alcançada pela marca institucional.

Mas talvez seja útil notar, por uma vez, os seus inconvenientes, sendo o essencial que quando se alarga o âmbito de uma marca reduz-se a sua força em cada uma das suas áreas específicas de actuação.

Danone significa iogurtes para toda a gente. E Nestlé, o que significa? A marca Nestlé tem associada a si conotações valiosas de amor familiar, nutrição saudável e responsabilidade, tudo ideias maravilhosamente condensadas no seu logotipo.

É fácil entender que isso atribui um valor automático a tudo o que a Nestlé propõe ao mercado, mas também que condiciona o domínio do que lhe é permitido, pois nem todos os produtos alimentares combinam bem com tais conceitos.

O reverso da medalha, porém, é que, em caso de dúvida, a palavra Nestlé remete prioritariamente para as farinhas lácteas que estiveram na sua origem. A pluralidade de sentidos inerente à marca Nestlé não tem só vantagens. O seu significado dilui-se por todo o vasto território que ocupa, uma fragilidade que a torna especialmente vulnerável à concorrência de marcas focalizadas numa área de produto muito específica.

3.6.06

Eu não assino

Nem de propósito: depois do post do outro dia sobre o Programa de Relacionamento com os Clientes do sindicato dos professores , recebi o seguinte email, que publico para mostrar que este é um blog democrático, aberto a todas as correntes de opinião, etc. Mas tenho muita pena, Rita: desta vez o Presidente da República vai ficar sem o meu autógrafo.

"Caros amigos,

está a circular na internet uma petição destinada ao Sr. Presidente daRepública que dá conta de afirmações insidiosas proferidas pela Ministra daEducação que denigre ainda mais a imagem social e a dignidade profissionaldos professores do nosso país.Cliquem no endereço abaixo, leiam o texto, assinem e divulguemhttp://www.petitiononline.com/piprep/petition-sign.html?

Rita Seco

http://www.aofuscolusco.blogspot.com/"

Inspirador

Se anda com algum brief encravado, recomendo uma visita urgente ao Centro Cultural de Belém para ver a exposição dos vencedores do Prémio Braun de Design. Garanto que vai sair de lá cheio de ideias. Eu saí.

1.6.06

Viral

Deu na Veja da semana passada:

"A campanha eleitoral pela internet passou a integrar a planilha de custos dos marqueteiros: 100 000 reais no caso de campanhas para governador. O pacote inclui defesas contra ataques de adversários e a difusão de denúncias por meio de emissários não identificados. No dicionário dos marqueteiros já há até nome para essas baixarias: campanha viral".

Está a ver, professor Carrilho? Estas coisas não acontecem só por aqui.

30.5.06

Magister dixit

Imagine que uma empresa de serviços – uma oficina mecânica, por exemplo - comunica aos seus empregados que na avaliação de cada um também passará a ser levada em conta a apreciação dos clientes.

O representante sindical da categoria reage imediatamente: “Inaceitável! O trabalho que fazemos é muito complexo, os clientes não têm a menor competência para avaliar se está bem feito ou não. Além disso, é intolerável que a opinião de meros clientes possa afectar a nossa progressão na carreira”.

Não foram estas, mas parecidíssimas, as palavras com que o representante dos professores rechaçou ontem a proposta da Ministra da Educação de que na avaliação dos educadores seja considerada a apreciação dos pais. É claro que ele não usou a palavra “cliente” – não faz parte do seu vocabulário, nem lhe terá alguma vez ocorrido que um pai de aluno é mesmo isso: o cliente. Ou seja, aquele que paga, e que ao fim do dia leva o produto que pagou, bom ou mau, de volta para casa.

27.5.06

Neutron Jack



Quando eu era miúdo, contavam-se anedotas sobre o General Electric. Em nossas casas havia televisões General Electric, frigoríficos General Electric, rádios General Electric, ferros de engomar General Electric.

Alguém sabe o que é que a General Electric, a empresa fundada pelo grande inventor Thomas Alva Edison, faz hoje? Aparentemente, faz dinheiro.

Quando, em 1981, Jack Welch tomou as rédeas da General Electric, ela empregava 411 mil trabalhadores. Oito anos depois, abandonara todas as linhas de produto que a haviam tornado mundialmente conhecida e reduzira os seus efectivos para apenas 276 mil pessoas.

O novo CEO ganhou a alcunha de Neutron Jack porque, tal como a bomba de neutrões, matava as pessoas deixando intactas as coisas.

Parece, pois, que o único propósito da General Electric passou a ser "gerar valor para os accionistas". Mas, aqui há uns anos, o economista britânico John Kay fez notar que as acções da empresa apenas haviam superado ligeiramente o índice Standard & Poor's. Por outras palavras, o "método do chimpanzé sueco", consistente em seleccionar aleatoriamente uma carteira de títulos, teria produzido no longo prazo ganhos equivalentes aos conseguidos pelo gestor mais admirado da América.

Não deixa de ser irónico que, vinte e cinco anos depois da ascensão ao poder de Jack Welch, a empresa outrora famosa pelas suas inovações seja mais conhecida do público pelos livros sobre a sua pessoa encomendados pela super-estrela do mundo de negócios do que pelos produtos que vende no mercado mundial.

25.5.06

Freud explica?

Há nas ruas uma campanha que, até por não ter qualquer pretensão à criatividade, ilustra lindamente a patologia de boa parte da publicidade portuguesa – mesmo a mais criativa.

A patologia foi descrita há uma porção de anos pelo Dr. Freud: chama-se narcisismo. Quanto à campanha, é a de um tal Grupo Sil.

Nunca tinha ouvido falar? Eu também não. E agora que ouvi fiquei na mesma.

Tosca como é, a campanha do Grupo Sil nem por isso é mais vazia do que outras, mais vistosas e melhor vestidas, que andam por aí. Num dos anúncios, por exemplo, fico a saber que eles têm uma recepcionista poliglota com 23 anos de casa. Uau!

No entanto, essa informação sem dúvida verdadeira, e de tremenda importância (pelo menos para a recepcionista: pensem bem, no caso de ela ser despedida, o tamanho da indemnização que vai receber) não é mais indiferente para a minha felicidade do que o facto de o BES ter uma nova cor. Ou de a TMN ter um novo logo.

A criatividade, às vezes, é só uma maneira gira (e cara) de mascarar a irrelevância.

24.5.06

Morreu de velho

“O que acontece a si, acontece aos seus”, diz a mais recente campanha da Fidelidade Mundial, destinada, segundo o Meios e Publicidade, a “sensibilizar o consumidor para os riscos e consequências de um acidente”. “Há coisas que só acontecem a quem tem seguro”, responde a campanha da Império Bonança, baseada, segundo a sua directora de marketing, num novo conceito comunicacional”… “em que se encontra subjacente o conceito de Aversão ao Risco”.

Sem entrar no mérito criativo das ditas campanhas, o estranho é como num sector já de si tão pouco propício à construção de identidades de marca (na mente do consumidor o elemento preponderante é sempre a imagem da categoria – e não é uma boa imagem) cada novo esforço de comunicação vem reforçar mais ainda a indiferenciação reinante. É como se nenhuma seguradora tivesse mais nada a dizer além de que é uma seguradora, e que é prudente fazer seguro.

A propósito, na Marketeer de Maio vem um suplemento especial sobre seguros, em que alguns directores de marketing desfiam as suas orientações estratégicas para este ano. De 9 entrevistados, 4 estão preocupados em fidelizar clientes, “através de upselling e cross selling”. É saudável. Mas praticamente todos baseiam as suas prioridades em problemas relativos à categoria, que pretendem todos resolver em proveito próprio. Ou seja, tencionam voltar a convencer-nos de que é bom fazer seguro. “Aumentar a notoriedade”, “reforçar a confiança” são as soluções de que se lembram grandes e pequenas marcas, aspirantes à liderança ou candidatos, no máximo, a um pequeno nicho.

Cheira-me que não vai funcionar.

22.5.06

Lifetime value, parte III: lavagem de dinheiro

Então foi assim: entrei na fila para lavar o carro, paguei, entrei naquele mega jacuzzi que os carros devem achar super excitante. Lavagem completa com mais não sei quê, 5 euros. Quando terminou fui-me embora, sem pensar mais no assunto.

Mas uns quarenta minutos depois, quando cheguei ao meu destino e saí do carro, olhei para ele e o coitado estava tão sujo quanto antes. O jacuzzi, por alguma razão, não tinha funcionado.

Como o posto da Galp ficava no meu caminho de volta, umas duas horas depois passei por ali e mostrei o carro ao senhor da mangueira. Ele entendeu mas não podia decidir nada; passou-me à supervisora. A supervisora entendeu mas não podia decidir nada; passou-me ao gerente. O gerente explicou-me que reclamações daquelas só podiam ser aceites imediatamente a seguir à lavagem. Argumentei que, sendo uma lavagem automática, a pessoa não sai do carro imediatamente a seguir à lavagem, simplesmente vai à sua vida. O amável gerente contra-argumentou que o sistema era assim e pronto, se eu tivesse alguma queixa pedisse o livro de reclamações.

Foi o que fiz. Saí a deitar fumo, por me terem lavado mais 5 euros em troca de nenhum serviço, mas já sem esperança de qualquer consequência.

Foi por isso uma surpresa quando, uns 10 dias depois, vou à caixa de correio e está lá uma simpática cartinha da Galp. Afinal eles ligam aos clientes, pensei. Mas não ligavam. O que a carta dizia era que não me podiam refazer o serviço nem devolver o dinheiro, porque, “como eu devia compreender”, reclamações daquelas só eram aceites quando feitas imediatamente após a prestação do serviço. Ou seja, após a lavagem automática eu devia ter saído do carro e verificado se estava mesmo lavado. Como não o fiz, lá se foram os meus 5 euros pelo ralo.

5 euros da lavagem, 1 euro do anúncio no FastAccess, numa mesma semana foi esse o meu prejuízo com a Galp. Visto de outra forma, esses 6 euros era o que a Galp me deveria ter devolvido, se me quisesse manter como cliente. Mas como o meu lifetime value não deve chegar a tanto, a Galp não se importou que eu me fosse embora de vez.

O que me chamou a atenção nestas duas histórias é que os processos de atendimento ao cliente funcionaram sempre: os meus e-mails acabaram por ser respondidos, a minha reclamação escrita chegou a quem de direito e foi respondida. Mas aparentemente foi respondida por máquinas, ou por pessoas que simplesmente executavam procedimentos, sem qualquer disposição para pensar ou decidir em função de circunstâncias especiais. A maior parte dos call-centers das nossas grandes empresas (em especial as de telecomunicações) estão cheios de pessoas assim. É por isso que, por mais sistemas que implementem, estas empresas só demonstram não ter entendido ainda o que significa a palavra “serviço”.

16.5.06

Lifetime value, parte II: o sistema tem sempre razão

Tudo aconteceu porque queria vender o meu carro (já agora, é uma carrinha Mondeo 2002, full extras, todas as revisões na marca – e se você for o primeiro a ligar ainda leva grátis uma assinatura da revista Certa).

Tive então a ideia de pôr um classificado no portal FastAcess. Custa um euro. Você manda um SMS com esse custo, eles enviam um código que teoricamente permite inserir o anúncio. Digo “teoricamente” porque quando pus o código o sistema não o aceitou. Pensei que o erro era meu (o sistema tem sempre razão). Paguei mais um euro, recebi mais um código, voltei a inserir, novamente o sistema não o aceitou.

Por essa altura já queria desistir – ainda por cima é um processo complicado, cada vez que há um erro é preciso voltar a preencher tudo. Mas, como não gosto que fiquem com o meu dinheiro, mandei antes um email à Galp: por favor resolvessem o problema, ou então devolvessem os 2 euros.

Quase uma semana depois tive uma amável resposta. O serviço Fast agradecia o contacto, mas não era ali. Era no balcão ao lado, no email do portal. Reencaminhar o email à pessoa certa é que não passou pela cabeça de quem me respondeu. O sistema não previa esse procedimento.

Mandei outro email, explicando outra vez a situação. Vários “reply” e três semanas depois, consegui que a amável senhora do outro lado me enviasse, “gratuitamente”, um novo código. Preenchi outra vez o formulário, tentei inserir o código e… erro.

Mais um email, a pedir o dinheiro de volta. Mas a senhora não conseguia entender como aquele erro acontecia, uma vez que o sistema estava OK. E, como não entendia, não devolvia. Inseriu ela o anúncio. Fiquei com um euro de prejuízo, paciência.

Pelo menos já tinha o carro à venda. Agora só faltava lavá-lo, para impressionar os compradores. Ora, a lavagem mais à mão era justamente na Galp Foi aí que, juntando uma coisa com a outra, acabei por descobrir o meu lifetime value: 6 euros, nem mais nem menos.

Como é que cheguei a essa conclusão? Hoje já não lhe posso explicar, está na minha hora de almoço. Apareça amanhã.

Lifetime value

E por falar em serviço, recentemente descobri qual é o meu lifetime value para a Galp.

Eu, com a minha tosca matemática, imaginava que ainda fosse um valor simpático. Só em abastecimentos são uns 60 euros, sem falar nos jornais e noutras conveniências, que deixo todas as semanas ali na estação de serviço de Oeiras. Mas uma empresa com o tamanho e a lógica da Galp (“Se a Galp é nº 1 em Portugal, Portugal pode ser nº 1 no mundo…”) tem instrumentos de cálculo muito mais sofisticados.

Esses cálculos, naturalmente, são secretíssimos, guardados numa torre ali para os lados de Sete Rios, bem longe dos olhos do consumidor - mas acontece que tive acesso a eles. E, assim, já sei quanto valho para a Galp, enquanto cliente, ao longo da vidinha toda.

São 6 euros, se faz favor.

Mas olhe, agora tenho que ir ali beber um café e não lhe posso explicar como cheguei a este número. Apareça aqui amanhã que eu conto a história toda.

15.5.06

Serviços sem serviço

Se uma coisa nem é agricultura nem é indústria, presumem os economistas que então deve ser um serviço.

Decorrem daqui muitas confusões, visto que muitas empresas de serviços não prestam qualquer serviço.

Quer falemos de empresas de telecomunicações, de transportes públicos ou de electricidade, a regra é elas limitarem-se a manter uma dada infra-estrutura física em funcionamento, acreditando que, dessa maneira, estarão a prestar um serviço.

Assim, a concessionária de auto-estradas acha que para prestar um serviço basta manter as faixas de rodagem abertas. O retalhista de combustíveis e lubrificantes supõe que o seu papel se reduz a manter as bombas abastecidas. O hospital acredita que cumpre a sua obrigação se tiver médicos, enfermeiros e equipamento diverso.

É verdade que, em Portugal, a linha telefónica ainda cai com demasiada frequência, os autocarros nem sempre são pontuais e se perdem muitas aulas por falta de professores. Esses problemas têm evidentemente que ser resolvidos, mas é um erro pensar que isso será suficiente para assegurar um bom serviço.

O nosso maior problema com a empresa de telecomunicações não é a avaria da linha, mas as enormes complicações de que somos vítimas quando necessitamos de algo que sai daquilo que a companhia considera a norma. Porque, precisamente, não há ninguém disponível para prestar serviço. Estou a falar de todas as empresas de telecomunicações sem excepção.

Ao contrário de um produto, um serviço é uma relação, e as relações são todas diferentes, quanto mais não seja porque a mera duração afecta o seu conteúdo. Os clientes vão adquirindo experiência no seu relacionamento com uma empresa ou com uma marca. Isso significa que aprendem a tirar melhor partido dela, mas também que as suas necessidades se vão transformando e sofisticando.

As empresas que verdadeiramente prestam serviço apercebem-se disso e, por conseguinte, vão fazendo evoluir a sua oferta por forma a adaptá-la à mutação das exigências dos seus clientes.

Isso, sim, é serviço.

9.5.06

Intimidade com o consumidor

Recomendo esta entrevista do Sérgio Santos a O Nosso Portfolio, que só agora tive ocasião d ler.

Pro testo

O termo “comunicação integrada” foi usado com tanta liberalidade que hoje se transformou numa receita infalível para pôr os clientes a dormir. Afinal, ou é uma promessa tão fácil de cumprir que está ao alcance de qualquer empresa, seja qual for a sua especialidade, ou tão esotérica que só mesmo a agência A ou B têm o know-how e os estrategas e os modelos e as ferramentas que permitem concretizar esse altíssimo ideal.

Os anunciantes desconfiam, e preferem aplicar o seu dinheiro naquilo que julgam conhecer. Um anúncio é um anúncio, um mailing é um mailing, um folheto é um folheto. Ou um flyer, como se diz agora, em bom portuglês. Se é isso o que a sua agência sabe fazer, é isso que estamos dispostos a pagar. A tal comunicação integrada fica para outra altura.

O que é pena, porque a tal comunicação integrada costuma ser uma simples aplicação do bom senso. Significa, antes de mais, que os vários departamentos de uma empresa comunicam uns com os outros. Assim, o que o marketing faz encaixa com o que fazem as vendas. O que a publicidade faz é reforçado, em vez de desmentido, pelo marketing directo. A marca tem a mesma cara na embalagem, no produto, na publicidade, na caixa do correio e na arenga do vendedor. Parece simples, não é?

Pois na prática, pelos vistos, é muito mais complicado. Ocorreu-me isso no outro dia, ao receber mais uma das brilhantes peças de marketing directo da revista Pro Teste.

Nunca comprei a Pró Teste, mas simpatizava com a ideia de uma revista dedicada a denunciar os abusos contra o consumidor, através de testes e estudos credíveis. Pois essa imagem desfez-se completamente quando passei a receber, por não sei que artes dos tratamentos de bases de dados, os tais mailings.

“Abra rapidamente, Exmo. Sr. Kopke, e fique a saber como poderá receber gratuitamente este leitor de MP3” “PEDIDO DE RESPOSTA URGENTE” “Último aviso para Exmo Sr Kopke”. “Mensagem urgente”. “Abra por aqui para descobrir os seus Cartões de Acesso Pessoais”. Tudo isso no mesmo envelope.

O uso dos truques mais rasteiros do marketing directo, à moda banha da cobra do Reader’s Digest, até pode ser eficaz para um determinado target. Mas certamente não reforça a credibilidade de uma marca para a qual a credibilidade é tudo. Um bocadinho de comunicação integrada – ou seja, bom senso – não faria mal nenhum aqui.

26.4.06

Planos de meios

O que faz um hotel lisboeta (o Fénix) entender que a melhor forma de conseguir clientes é embrulhar autocarros da própria Grande Lisboa com a sua mensagem publicitária? Sinta-se em casa, dizem os autocarros. Pois é assim que se sentem as pessoas que vêem o anúncio a circular, mas para isso não têm ir para nenhum hotel: basta irem mesmo para casa.

O mesmo padrão de bom senso é o que deve ter levado o Instituto de Prevenção de Acidentes de Trabalho (se o nome não for esse é equivalente) a lançar uma campanha de sensibilização para os tais acidentes usando spots de rádio. Quantas das pessoas que vão no seu carro a ouvir a TSF são um grupo de risco para acidentes de trabalho? Mesmo no caso remoto de lhes acontecer um – sei lá eu, derramarem o café a escaldar no colo de uma cliente, ou ficarem presos no elevador do escritório com um colega mal desodorizado – a dita “sensibilização” ter-lhes-á servido para quê?

Este último caso é mais grave, porque o brilhante plano de meios provavelmente foi pago com o nosso dinheiro. Aquele dinheiro público que não há, e que por isso nos tem que ser arrancado à força de aumentos de IVA e assemelhados.

24.4.06

Precision

A minha caixa de correio é como a sua: todas as manhãs enche-se de papelada que em menos de 30 segundos já está no caixote do lixo.

Hoje mesmo havia um catálogo não endereçado de supermercado e um de uma loja de bijuterias, endereçado à minha mulher, mas desacompanhado de qualquer argumento que a fizesse desejar ver aquilo. Havia também um folheto de um restaurante de Mafra – sendo que eu moro em Oeiras, e dificilmente vou fazer um desvio para um almocinho no restaurante Jovem.

No meio de tanta árvore cortada em vão, é reconfortante ver que alguém, pelo menos, tenta fazer comunicação dirigida como deve ser. Estou a falar das oficinas Precision.

Hoje havia 2 mailings da Precision. O que trazia o meu nome vendia a rede de lojas, usando um personagem masculino de banda desenhada. O que estava endereçado à minha mulher vendia o serviço 24 h, lembrando-lhe o risco de ter algum azar quando está ao volante sozinha, à noite. Tenho absoluta certeza de que é um argumento que a faz pensar.

Lá dentro havia promoções e argumentos. Como não é a primeira vez que recebo mailings destes (a frequência de contacto que mantêm faz com que sejam sempre lembrados), sei que pelo menos um ou dois dos vales que mandam costuma ser aproveitável.

Claro que nem tudo é perfeito. Há algum tempo, fui usar uma das promoções que me propunham, específica para mim, que sou sócio do ACP, e descobri que na loja ofereciam o mesmo desconto a toda a gente. Fazerem-me sentir especial para depois voltarem atrás não é bom marketing.

O que o programa de direct mail da Precision mostra, no entanto, é que o marketing directo pode ser uma ferramenta simples e bastante poderosa. Um pouco de bom senso e consistência já bastam para conseguir uma rentável fidelidade dos clientes.

8.4.06

Tabela de preços

Ao contrário do que dizia o Frederico Saldanha outro dia no Briefing, as coisas do outro lado do Atlântico podem não estar assim tão mais brilhantes do que aqui. Pelo menos a julgar por esta Tabela de Preços, sugerida por Geison Uilian para o "Sindicato das Agências".

Serviços extras depois do trabalho pronto:

"Aumenta essa letra?".................................................................R$ 50,00
"Coloca esse amarelo mais vivo?"..................................................................R$ 90,00
"Troca esse vermelho por amarelo?"..............................................................Sob consulta
(Em casos como trocar o tom da pele de uma foto fica
mais muito mais caro).

(Depois de pedir incessantemente pelo estetoscópio na capa
do manual médico) "É mesmo, né? Não ficou muito legal... E agora?".................................................................R$ 6.000,00
"Puxa mais pra cá... Isso agora mais pra cá, isso, troca essa cor...
Agora inclui essa foto... Podia mudar aqui né? Hum...
Pô parece que piorou não estou entendendo..."..........................................................R$ 8.500,00

SERVIÇOS

Logotipozinho, logomarcazinha, marquinha e marquinhazinha................R$ 2.250,00 (preço também válido para "logotipo bem pequenininho",
"simbolo", "desenho pra colocar no cartão" e "elipse")
Convitezinho.............................................................R$ 345,00
Um folder
rapidinho................ ............................................R$ 1.250,00
Jeitinho aqui.............................................................R$ 150,00
Folhinha/Filipeta.........................................................R$ 355,00
Folhinha pra tirar xérox mesmo.....................................................................R$ 456,00
Uma faixa aí............................................................. ..........R$ 2.230,00
Cartãozinho mixuruca..................................................................R$ 150,00
"Igualzinho a esse aqui, só vai colocar o meu timbre
ao inves do dele aqui em cima, entendeu? Pra não dar
trabalho mesmo...".................................................................R$ 1.000,00
Sem muitos detalhes..................................................................R$ 350,00
"Ei, você que mexe com computador..."..........................................................R$ 500,00
"O chefe do departamento ja escolheu até a letra e a cor, agora ficou fácil"....................................................................R$ 250,00
"Na verdade o serviço JÁ ESTÁ PRONTO! É só colocar
um pouco de design"....................................................................R$ 750,00
"É só uma firula mesmo né?"...................................................................... R$ 450,00
"Na verdade é porque eu não tenho tempo pra fazer..."...............................................................R$ 2.500,00"
Eu confio em você, vê ai alguma coisa.." (não sabe nem o nome da empresa).................................................................R$ 5.500,00
"Depois a gente vê uma maneira de te compensar..."............................................................R$240.000,00
"Uma faixa aí......................................................................R$ 2.230,00
Cartãozinho mixuruca.................................................................R$ 150,00
Só pra não passar em branco (Folder de aniversário de 50 anos da empresa)................................................................R$6.000,00
POR PÁGINA??????".......................................................R$ 345,00 (cada vez que a pessoa repetir essa frase)
"Ah.. tá.. ms isso ja estão incluidas as fotos e as modelos né?"..................... ...............................................R$ 150,00
"É só esticar aqui, ó".....................................................................R$ 60,00
"Coisa simples" (isso é sacanagem!!!) .........................................................R$ 2.500,00
"Não você não entendeu é simples mesmo".................................................................R$ 3.500,00
"É você não entendeu mesmo"................................................................R$ 4.500,00
"Só uma galeria de fotos. Quantas fotos? Ah umas 100, mas
é so colocar ali no to canto".................................................................R$ 890,00
"Ué, mas é só digitar como tá aqui no jornal."................................................................R$ 980,00
"Escaneia daqui da revista mesmo"..............................................................R$ 200,00
"DUZENTOS E CINQUENTA REAIS???".......................................................R$ 50,00 (subir mais R$ 50,00 a cada grito de desespero)
"Ah!! Pode pegar o logo do nosso site, não tem problema nenhum,
eu autorizo. É so clicar com o botão direito do mouse em cima
e ir em 'salvar como'..."..............................................................R$ 890,00
"COMO ASSIM, SEM A IMPRESSÃO???"...........................................................R$ 200,00
"Tá, tudo bem... E fica pronto quando? Pode me mandar
uma previa por email hoje à noite?"..................................................................R$ 5.000,00

6.4.06

Ries na TSF

Acabo de ouvir o Al Ries entrevistado pelo Carlos Vaz Marques na TSF. Nada de novo, para quem já conhece as ideias do senhor, mas é sempre interessante voltar a passá-las em revista. Não faltou a "marca Portugal", uma espécie de obsessão nacional à espera de passar da fantasia a qualquer coisa concreta. Sugestão do Al Ries: criem marcas de marisco de preço alto. Quem se habilita?

O entrevistador esteve bem. Num programa de 45 minutos, para o público leigo, permitiu que o entrevistado passasse em revista todos os seus tópicos importantes, com toda a clareza.

27.3.06

Morte anunciada

Os jornais informam que a Daimler-Benz decidiu descontinuar a versão Forfour do Smart.

É interesssante notar que o Henrique previu antecipadamente este fiasco num post que, de momento, eu não consigo localizar. Uma lição para quem julga que as armadilhas do posicionamento não são para levar a sério.

16.3.06

Pensamento

Um amigo, que de momento prefere conservar o anonimato, opina que o ser humano revela a sua pior faceta como cliente de uma agência de publicidade. É capaz de ter razão.

Direito à publicidade e concorrência

A propósito da campanha em prol do Direito à Publicidade, lançada pela NormaJean (não pela APAP) Sandro Mendonça lembra ontem, no Diário Económico, que a publicidade pode contribuir para reduzir a concorrência ao reforçar as barreiras à entrada num determinado sector de actividade.

Tem razão, evidentemente, e não faltam exemplos para o confirmar.

Todavia, convém também considerar o que acontece na situação oposta, ou seja, quando a publicidade é proibida. Ora o que os estudos empíricos revelam é que a interdição da publicidade num mercado pode ser uma forma eficaz de proteger os produtores instalados. Por exemplo, a proibição da publicidade ao tabaco praticamente impediu o lançamento de novas marcas de cigarros. Aliás, o mesmo efeito é obtido quando a Ordem dos Advogados bane a publicidade aos escritórios de advogados.

Por conseguinte, talvez pudéssemos antes dizer que o que efectivamente reduz a concorrência não é o direito à publicidade ou a ausência dele, mas o grau de apego que em determinado momento e em determinado mercado os consumidores manifestam em relação às marcas. E convém lembrar que, quando se desinteressam delas, não há publicidade que lhes valha.