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Briefing endereçou-me algumas perguntas sobre "Marcas e portugalidade". Reproduzo seguidamente as minhas respostas na íntegra:
Como estratégia, considera importante a associação das marcas aos valores
da portugalidade? Porquê?
Há marcas cuja sedução resulta em grande parte da associação a um país: McDonald's simboliza o
american way of life, Dolce & Gabanna epitomiza o estilo italiano, Mercedes corporiza os preconceitos favoráveis em relação à Alemanha, Guinness funciona como emblema da Irlanda. Do mesmo modo, a portugalidade está inscrita no ADN de algumas marcas portuguesas, mas não de todas (nem sequer da maioria).
Ser português é uma vantagem competitiva?
O valor de origem relaciona-se com bens primários provenientes de uma região ou país (Camembert, Rioja) ou com uma competência desenvolvida numa certa parte do mundo (porcelanas de Sèvre, relógios suíços, automóveis da Bavária). Ser-se uma marca portuguesa é decerto uma vantagem no mercado do azeite (Gallo), mas também no papel ou nos transformados da cortiça (Portucel ou Amorim). Note-se que as marcas portuguesas mais fortes internacionalmente não são de bens de consumo, mas de equipamentos e produtos intermédios, tais como papel, cortiça, acessórios para automóveis, moldes para plásticos, máquinas para o trabalho da madeira.
Até que ponto os consumidores valorizam essa associação? Será que ela
influencia as decisões de consumo ou apenas a sua percepção das marcas?
Os consumidores valorizam a associação a uma origem quando ela funciona como chancela de qualidade num qualquer domínio, seja ela real ou resultado de um preconceito sedimentado ao longo do tempo. Parece que um nome vagamente italiano continua a ajudar a vender roupa. A Sony adotou originariamente esse nome para parecer americana. Haagen-Dasz, um nome com conotações nórdicas, persuadiu os americanos de que se tratava de um gelado mais sofisticado.
O facto de uma marca portuguesa ser detida por uma empresa estrangeira
retira-lhe "portugalidade" ou é indiferente?
Em geral, é indiferente. Mas pode mesmo dar-se o caso de a multinacional compreender melhor o valor dessa portugalidade. Duas marcas do
portfolio da Unilever – Gallo e Vaqueiro – parecem comprová-lo. Porém, há casos em que as marcas portuguesas são compradas por concorrentes que pretendem apenas liquidá-las (Longa Vida, por exemplo).
Qual a sua opinião sobre as marcas - e isso acontece muito na moda - que
adotam nomes estrangeiros? Será uma forma de se apresentarem como marcas
globais ou decorrerá de um certo preconceito sobre o que é nacional?
O preconceito em relação aos produtos nacionais pode ser justificado em certos sectores de actividade, logo torneá-lo adotando uma designação com conotações internacionais será eventualmente uma tática inteligente. A maioria das vezes, porém, não existe uma ambição global, mas apenas uma intenção de confundir o cliente local.
Do ponto de vista sociológico, poderá a actual crise acentuar o sentimento
de portugalidade?
Se o país reencontrar rapidamente o seu lugar na Europa, não haverá um recrudescimento do nacionalismo. Se, porém, persistir e se aprofundar o atual caminho de desagregação da União Europeia, é muito provável que isso aconteça. Em ambas as alternativas, seria bom que os portugueses construíssem uma imagem mais consistente e produtiva do seu país (e do seu lugar no mundo) como remédio contra a saloice reinante.