Aqui ficam, com algum atraso, algumas ideias que me foram suscitadas pelo encontro organizado pela UNICER para discutir o tema dos blogues empresariais, já aqui comentado pelo Jayme:
1. Que eu saiba, este foi o primeiro debate público no nosso país sobre o tema. Só por isso, a UNICER merece ser felicitada.
2. A intervenção principal, a cargo de Bruno Gissiani, foi interessante e estava bem estruturada. Mas não é preciso padecer de patriotismo serôdio para considerar que, para fazer uma apresentação sobre a relevância dos blogues no mundo de hoje, não seria preciso ir buscar alguém à Suíça. Estou certo de que o Paulo Querido, por exemplo, teria dado conta do recado com geral satisfação.
3. Não estou certo de ter compreendido bem o propósito do encontro para a UNICER. Se, ao reunir uma plateia de gente razoavelmente envolvida com o tema, a ideia era recolher algumas ideias eventualmente úteis para a empresa, então a UNICER e a LPM falaram de mais e escutaram de menos.
4. Faz pouco sentido perguntar-se em abstracto se uma empresa deve ou não ter um blogue. Mas faz ainda menos separar os blogues das outras modalidades de intervenção na internet.
5. Há três anos, apenas 4% das 500 maiores empresas americanas tinham um blogue. Hoje, essa proporção aumentou para 11%. É possível que algumas o façam apenas porque é moda, mas acredito que a maioria saberá exactamente o que pretende.
6. Assim, à pergunta: "Deve a UNICER ter um blogue empresarial?" deve responder-se com outra pergunta: "Para fazer o quê?"
7. Encarar os blogues apenas como um novo suporte publicitário (ou mesmo como mais uma arma de relações públicas) é certamente um erro.
8. O marketing relacional que a internet nos condena a adoptar não é uma maneira diferente de fazer publicidade, é uma maneira diferente de fazer marketing.
9. O ponto de partida é este: os consumidores e o grande público em geral conquistaram imenso poder com a Web 2.0, e servem-se dela para se organizarem e para aumentarem a sua capacidade negocial. Logo, qualquer marca deverá começar por interrogar-se sobre o modo como essa nova realidade afecta o seu negócio, o seu mercado e o comportamento de compra dos seus clientes.
10. Os consumidores já não se encontram hoje isolados: conversam uns com os outros e usam o seu poder recém-conquistado num sentido que pode ser positivo ou negativo para a marca. Usar a net para escutar os clientes - como sugeriu António Pires de Lima - é uma boa maneira de começar, mas não é aceitável que uma empresa se fique por aí.
11. Uma das características do novo marketing é a fusão num único processo de dois movimentos anteriormente separados: a) a comunicação da marca com os clientes e b) a comunicação dos clientes com a marca. Por outras palavras, desaparece a distinção entre "publicidade" e "pesquisa".
12. Sendo assim, que sentido faz escutar os clientes se não for para dar resposta às questões que eles levantam quando dialogam entre si?
13. São infinitas as possibilidades de utilização dos blogues e da net por uma marca. A escolha da mais apropriada depende da prévia identificação dos desafios mais relevantes.
14. Sabe-se que, tanto na América como na Europa, há blogues escritos por CEOs. Mas essa opção nada tem de obrigatório ou sequer meramente recomendável. Alguns CEOs têm vocação para isso, outros não.
15. No encontro alguém desaconselhou o recurso a escritores profissionais para escreverem blogues de empresa, sob pretexto de que um blogue exige sinceridade. Esqueceu-se de que ser sincero a troco de dinheiro é algo que advogados e publicitários fazem pelo menos desde a Antiguidade Clássica.
16. O patrocínio é talvez a principal forma de comunicação de marketing na net. Se eu fosse à Super Bock tentaria tudo para conseguir patrocinar o blogue do Maradona. Parece-me inútil explicar porquê.
17. Também me pareceu mal colocado o problema da avaliação da eficácia dos blogues como ferramenta de comunicação. É evidente que isso é importante, e é um facto que a internet facilita em geral a tarefa da avaliação. Mas comparar audiências potenciais de um blogue com audiências de televisão não faz o mínimo sentido.
18. Um blogue é um dentre vários instrumentos possíveis de contacto com uma comunidade de clientes. Do que se trata, pois, é de avaliar o impacto global de um tal esforço no quadro dos relacionamentos online e offline da marca com o seu mercado e de definir o papel que nesse contexto deverá incumbir a um ou vários blogues.
19. Pareceu-me evidente o receio de, na blogoesfera, a UNICER poder perder o controlo sobre as suas iniciativas de comunicação. Esse problema será superado naturalmente no dia em que a UNICER compreender que ela já não tem esse controlo.
20. O autoritarismo cultural afigura-se-me o principal óbice a uma intervenção mais arrojada das empresas e das marcas portuguesas na internet. É aí, no pouco caso que fazem das hierarquias e dos mecanismos rígidos de controlo, que os EUA vão muito à frente.
Visit me at armandoalves.com
Há 4 anos
2 comentários:
Resumindo... se bem percebi, a Unicer ainda está na idade da pedra.
Pachorra.
O Miguel Albano faz também uma boa reflexão sobre as conversas unicer em http://notaboutyou.lift.com.pt/
Enviar um comentário