6.9.07

Tudo isto é triste mas nada disto é fado

Fala-se muitas vezes, aqui e noutros sítios, do baixo nível da comunicação e das decisões de marketing que as suportam como se fossem parte daquele fado nacional que faz com que certas desgraças, “só neste país”. Felizmente ou infelizmente, não sei bem, a verdade é bem outra.

Creio que foi em 2005 que o britânico Steve Harrison, director criativo mundial da Wunderman, fez em Cannes uma apresentação bastante concorrida cujo tema era, justamente, “Por que os clientes aprovam trabalho tão ruim”. A resposta tinha a ver com a rotatividade dos responsáveis de marketing, que os desresponsabiliza das decisões de longo prazo, com a sua inexperiência e escandalosa ignorância sobre o que diz respeito à comunicação publicitária. Harrison relatava experiências com plateias de marketeers ingleses em que eram incapazes de demonstrar um mínimo de cultura geral sobre a disciplina em que as suas decisões tinham tanto peso.

O diagnóstico não é original, nem exclusivo (vá lá) do Reino Unido. No seu Cutting Edge Commercials, Jim Aitchison cita Huck Mackay, “social researcher” australiano, que, a propósito de haver tanto recurso a maus estudos de mercado, dispara: “So many clients, in the interests of down-sizing and cost-cutting, have stripped out very mature people from the middle management ranks and trimmed down their marketing departments. What’s lost is a lot of corporate wisdom. So what you are often dealing with are only very senior people, who don’t have time to get involved in the creative process, and relatively junior people who have no corporate memory and not much experience at all, being asked to make million-dollar creative campaign decisions. Of course they feel insecure, so they fly to the arms of research for reasons to do with their own insecurity, rather than because the research has a track record of saying we can tell you which ad is going to work and which one isn’t”.

É claro que as agências não ficaram imunes ao “dowsinsing and cost-cutting”, logo o que temos são criativos que até podem ser talentosos, mas sem grande experiência, a falar com gestores de marketing idem. E a experiência faz falta, seja para separar as ousadias disparatadas das que fazem sentido, seja para ter estofo e força política para fazer valer as segundas. O resultado é o que se vê por aí.

6 comentários:

Anónimo disse...

Qual será o perfil do DM nacional?
Beto, 29 anos,ambicioso, gosta de dar nas vistas com os amigos, gosta de parecer importante aos olhos da agência, completamente deslumbrados com o "glamouroso" mundo do mkt (secretamente queriam estar do outro lado), torcedor do sporting, casava com a Isabel Figueira, bebe superbock ou Monte Velho, é conforme, fuma Marlboro light, tira férias no algarve, já esteve uma vez em londres, outra em Andorra, casado, pai de uma criança ainda bebé, e lê regularmente a maxmen. Enfim, a mediocridade do costume. São estes indivíduos que aprovam as campanhas em Portugal.

Edie Falco

Consumering disse...

Não me parece que a inexperência seja a fonte do mau trabalho, nem da ignorância (quantos administradores séniors, com background "no negócio", são os próprios agentes provocadores da barbaridade?).
Acho que o problema está em:
- Separação do objectivo comercial.
- Fragilidade teorica da "ciencia"
A primeira causa é compreensível e até desejável para a classe, a vida é mais fácil para quem não tem obrigações, o mal está em quem é anjinho e paga.
A fragilidade da teoria é responsabilidade total dos académicos que (ainda) não conseguiram criar um corpo coerente da ciencia que sirva de filtro às boçalidades mais flagrantes.
Onde andam os académicos do Marketing?

João Pinto e Castro disse...

"Torcedor do Sporting"... Fredie, isso é uma acusação grave!

Anónimo disse...

Pois, Sr. Dr., a aposta deles é sempre furada... a prova são as campanhas que por aí se vêem.

Consumering: tive dificuldades em perceber o que quis dizer. Muita teoria e muita ciência.

A verdade é só uma: se esses betos directores de marketing que por aí abundam não sabem nem escolher uma gravata de homem e nem cortam o cabelo (todos a copiar a "cabeleira Quinta da Marinha") como deve ser, como é que vão saber aprovar uma campanha??????

O problema é de fundo.

E digo mais... os criativos neste país até já conseguiram fazer o trabalho de casa. O problema está do lado de lá. Uma saloice pegada. Trabalhar para um pato bravo dá sempre no que já se sabe.

Edie Falco

Consumering disse...

edie, a eventual conformidade intelectual da "elite" portuguesa não pode ser causa para um problema global.
O JPC reclama com justiça ignorância de muito marketeiro, ligando-a à inexperiencia dos mesmos e eu (atabalhoadamente) tentei explicar que me parece que o problema não está na inexperiencia (pois não faltam administradores séniors ignorantes) mas sim na inexistencia de uma cartilha cientifica que separe o certo do errado na profissão.
Um conjunto de regras e "certezas" que (a existir) impediria muito publicitário de enganar os marketeiros para satisfação da sua ambição de artista frustrado.
mais claro assim?

Anónimo disse...

Pois. o problema, como já exemplificou mais adiante o Exmo. Sr. Dr. JPC, é quando o publicitário artista frustrado encontra um marqueteiro vedeta de revista frutrado, que tudo o que quer é aparecer. É uma boa explicação para essas "campanhas" que andam pelaí.

Vou dar outro exemplo: alguns marqueteiros vêm de outras áreas, como por exemplo o jornalismo, e depois acham-se na obrigação de se afirmar como marqueteiros. Nada como aprovar uma campanha "do caraças" – que dá nas vistas mas... fica por aí.

Edie Falco