A confirmar-se que Jorge Maria Bergoglio ficara há oito anos em segundo lugar na eleição que escolheu Bento XVI, teve muito tempo para pensar no que faria e diria se tivesse sido ele a ganhar a votação. E o facto é que usou bem esse tempo de que dispôs para se preparar.
Para começar, não se dispôs a ser mais um de uma longa série de predecessores, tipo João XXIV, Bento XVII, Leão XIV ou Gregório XVII.
Em vez disso, optou por ser o primeiro e, até agora, único, de uma nova dinastia: Francisco, simplesmente Francisco, the one and only. Depois, Francisco é uma excelente escolha, remetendo de pronto para uma das figuras mais geralmente respeitadas pelo povo cristão (não meramente católico), S.Francisco de Assis, il poverello, o servo dos pobres e ofendidos, o amigo da natureza, o homem culto e rico de nascença que optou pela simplicidade de vida, de palavras e de maneiras. Enfim, uma figura mitológica apropriadíssima para os dias de hoje.
Sem deixar tempo a especulações, a primeira aparição do Papa, escassos minutos após o anúncio da sua eleição, marcou um estilo coerente, pela redução do vestuário ao mínimo apropriado às circunstâncias, prescincindo da tradicional estola papal, dirigindo-se ao povo reunido em frente a S. Paulo numa linguagem despretensiosa, apresentando-se como o bispo de Roma, pedindo a benção dos crentes e, finalmente, desejando a todos uma noite repousada.
No dia seguinte, no seu primeiro acto oficial, deslocou-se numa das viaturas mais vulgares do Vaticano para ir rezar a Maria. Em seguida, no final de uma concorridíssima conferência de imprensa em que falou sobretudo da necessidade de reconstruir um igreja pobre, dos pobres e para os pobres, explicou que não abençoaria os presentes por respeito pelos jornalistas não crentes ali presentes, o que lhe rendeu, como não poderia deixar de ser, uma estrondosa salva de palmas.
Este papa percebe perfeitamente como funciona o sistema mediático comtemporâneo, ávido de construir mitos fantasiosos com um mínimo de matéria prima sólida. Quem não se antecipa a construir rapidamente uma narrativa e a dotá-la de sub-enredos comprováveis e, por isso, credíveis, arrisca-se a deixar-se enlear numa construção desfavorável que depois terá muita dificuldade em desmontar, passando demasiado tempo a defender-se e perdendo, por isso, a iniciativa na luta pela conquista da opinião pública.
O papa construíu assim em pouco tempo e com grande sucesso um posicionamento distintivo, apelativo e credível. Com isso alcançou uma imagem pública fortíssima que, para além de lhe granjear um entusiástico apoio popular, coloca para já em sentido os muitos adversários e inimigos que decerto tem.
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Há 4 anos
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