16.6.13

Esta é a carta que nunca te escrevi.



O nosso João nasceu em 8 de Agosto de 1950, no Porto, cidade que sempre fez parte da sua identidade. 
No dia em que nasceu, o seu pai, o Engenheiro Francisco Almeida e Castro, Presidente da CP, homem pelo qual sempre nutriu a mais profunda admiração e respeito, estava nos Estados Unidos, num comboio a caminho de Chicago, preso durante dias numa tempestade de neve, viagem essa que resultou na introdução em Portugal da primeira locomotiva diesel.

Era ainda criança quando a família se mudou para Lisboa, cidade que amou profundamente, e onde cresceu e viveu quase toda a sua vida.
O Zinho, como a família sempre o chamou, corria e brincava na zona da Av. Roma e frequentou o Liceu Camões onde foi um aluno exemplar.
Enquanto jovem revelou ter um assinalável jeito para o desenho e um sentido estético apurado que facilmente poderia tê-lo levado a ter se tornado num grande artista plástico, facto facilmente comprovável pelos seus inúmeros desenhos e pequenas pinturas que há poucos anos reencontrei, arrumados numa velha caixa.

Educado em piano clássico por uma querida professora que mais tarde veio ser também minha e da minha irmã, a música sempre teve uma importância enorme para ele. Na nossa casa a música inundava constantemente o espaço, paixão visível pela forma como coleccionava LP’s, como se fossem a banda sonora da nossa felicidade.

Foi já na Faculdade de Economia que conheceu a senhora minha mãe, mulher carinhosa e de forte carácter, que desde o primeiro momento amou de forma sempre leal e honesta. Juntos partilharam as alegrias e dificuldades da vida, próprias de um jovem casal. 

Enquanto estudantes, envolveram-se activamente na luta política contra o regime fascista, da qual não faltam histórias absolutamente fantásticas algumas que ele próprio nos contou e outras que ainda vou descobrindo nos relatos de alguns dos seus bons amigos.

Várias vezes teve a grandeza de agir de forma contra-intuitiva, em nome da liberdade de pensamento que sempre defendeu com unhas e dentes.

3 anos após a revolução, teve o seu primeiro filho, eu, e passados 3 anos teve uma filha, a menina dos seus olhos, a minha irmã Inês.
Connosco sempre tratou de forma carinhosa, sempre um bom pai, sempre nos deu todas as oportunidades. 


O seu percurso profissional levou-o ao Marketing e à Publicidade, passando pela Direcção de Marketing de grandes empresas internacionais como a Ogilvy e a Wunderman e culminando na criação de uma Agência de sucesso, a Interact e mais recentemente na Ology, onde tive a enorme sorte de trabalhar a seu lado.

Guardo com muito carinho e saudade estes últimos 3 anos que passámos juntos, diariamente, e em que tanto me ensinou. Feliz circunstância essa em que, no auge da crise, perdi o meu emprego em Londres, o que me trouxe de volta a Portugal, de volta ao meu Pai e à senhora minha Mãe. Feliz circunstância essa que me permitiu este período em que reaprendi a estar com eles, a valorizá-los mais e a encontrá-los, em mim.

Possuidor de uma cultura absolutamente enciclopédica, que toda a vida alimentou consumido livros, música e cinema a uma velocidade estonteante, o João tornou-se conhecido na sua vida profissional pela verticalidade de princípios, pelo imenso respeito pelos outros, pelo seu altruísmo militante e pelo compromisso absoluto de continuamente se superar enquanto homem.

Era um homem pacifico, mas nunca conformado, sempre exigente com a vida e com os outros na mesma proporção em que era exigente consigo próprio. 
De entre as suas excepcionais qualidades sempre me impressionou a sua capacidade de sintetizar assuntos complicadíssimos, de resolver a complexidade sem qualquer esforço aparente. Como um artista que resolve tudo com um só gesto.

Sempre cuidado na sua presença, sempre ponderado nas suas palavras, o João era um verdadeiro alquimista no uso da palavra. 
Apreciava o discurso da mesma forma que sabia apreciar o silêncio.
Sabia ouvir os outros, era tolerante, e aceitava a diferença como ninguém.
Não se impunha, entendia e respeitava o espaço de cada um.
Era um grande conversador, um verdadeiro contador de histórias.
Vamos ter muitas saudades de o ouvir e de o ler. 
Da sua voz e da alegria que disponibilizava em tudo o que fazia.

Era um homem que amava ensinar e que se envolvia como um pai no percurso dos muitos alunos que tiveram a sorte de o ter como professor. Sei agora como essa forma de se relacionar com os alunos era apreciada e por isso reciproca.

O João era um homem que nunca se demitiu das suas responsabilidades.
Há uns dias, pedi-lhe que delegasse em mim os compromissos profissionais que o apoquentavam.  E ele disse: “ Não filho, em Julho, quando eu estiver melhor, eu próprio tratarei dos assuntos pendentes e de ver os trabalhos dos meus alunos.”

Na fase final da sua doença, é assinalável o enorme prazer que retirava das visitas dos seus amigos. As conversas com os amigos pareciam um remédio milagroso, e não fora o cansaço físico dir-se ia que estava encontrada a cura que o traria de volta.

Faltam-me as palavras para descrever a forma incrível como se manteve lúcido até aos últimos dias em que a vida o traiu. Impressionou-nos a forma como nunca se queixou da sua má sorte. Como manteve sempre a sua elevação e o seu acutilante sentido de humor. 

No meu aniversário, no passado dia 5 de Junho, ele estava, fraco, deitado numa cama de hospital, e eu aproximei-me dele e disse-lhe:
“Parabéns querido pai, faz hoje 36 anos que me tiveste. Lindo serviço!” 
Ao que ele me respondeu na sua doce e já algo debilitada voz: 
“Sabes André, foi o que se pôde arranjar.”

O nosso João nunca desistiu de viver. Caiu de pé como todos os grandes homens.
Defendeu as muralhas da cidade como ninguém, lutando como um herói, pronto a dar tudo pela sua família, pelos seus amigos e por tudo aquilo em que acreditava.
Nunca falou da morte talvez por não acreditar nela. 
Nunca mostrou uma pinga de medo. 
E isso é para mim a verdadeira imortalidade.

Da enorme tristeza de o ver partir, sobra-nos o alivio que sentimos de saber do fim do seu sofrimento e resta-nos a eterna saudade. 
É hoje nossa obrigação manter a sua memória viva aprendendo com ele a viver a vida até ao último momento, sempre com a máxima dignidade e amor pelo próximo.

Esta é a carta que nunca te escrevi.

Até já querido amigo,
André Castro


15.6.13

Professor Doutor João Manuel Pinto e Castro 08/08/1950 – 14/06/2013



Sua mulher Maria Regina Lourenço Ferreira, seus filhos André Ferreira e Castro e Inês Ferreira de Castro, sua mãe Maria Alice Torres Pinto de Castro, sua irmã Maria Leonor Pinto e Castro e demais família, participam o falecimento do seu ente querido na sequência de doença prolongada.

7.4.13

Alcoólicos heterónimos



Faz sentido, não faz? Se o seu produto tiver que escolher uma cara para o representar, tem lógica que seja um heavy user. Se for um carro, ou um lubrificante, pode ser um piloto de fórmula 1. Se for um banco, alguém com muito dinheiro (o Mourinho, o Cristiano Ronaldo...). Agora, se for uma bebida alcoólica, razão tem o Licor Beirão: ninguém melhor do que um famoso e consagrado alcoólatra.

É claro que Fernando Pessoa tinha muitos outros predicados. Mas este era um deles, e foi aquele que (involuntariamente, quero acreditar) quem criou o anúncio despertou de imediato na mente deste consumidor que vos fala.

Ajudou que na altura em que vi o spot tivesse no colo o portentoso Fernando Pessoa, uma quase autobiografia, do advogado brasileiro José Paulo Cavalcanti Filho, que tem um capítulo inteiro dedicado à (estreita) relação do poeta com a garrafa. Não, não altura não era o Licor Beirão, mas acho que se já se anunciasse não seria rejeitado. Pessoa, na sua própria definição, não era uma esponja: era "uma loja de esponjas, com armazém anexo". Do género de ter acessos de delirium tremens (sobre os quais, como não podia deixar de ser, em seguida fazia um poema).

Não creio que fosse intenção da agência ou da marca fazer um filme tão politicamente incorrecto. Só que a ideia, que até é ingénua, e se limita a brincar com o que qualquer português que tenha feito o 11º ano sabe sobre Pessoa, acaba por fazer um retrato do poeta mais fiel do que se queria. A escolha do actor já foi muito boa.  Mas pô-lo, como gostava, de copo na mão - e a beber por três, uma vez que se juntam à festa Ricardo Reis e Álvaro de Campos, numa espécie de Associação dos Alcoólicos Heterónimos - é o toque de génio.

A publicidade, que Pessoa também praticou, sem muito jeito para a coisa, às vezes é um bocado traiçoeira.

Jayme Kopke
da Hamlet

16.3.13

Um papa bem posicionado

A confirmar-se que Jorge Maria Bergoglio ficara há oito anos em segundo lugar na eleição que escolheu Bento XVI, teve muito tempo para pensar no que faria e diria se tivesse sido ele a ganhar a votação. E o facto é que usou bem esse tempo de que dispôs para se preparar.

Para começar, não se dispôs a ser mais um de uma longa série de predecessores, tipo João XXIV, Bento XVII, Leão XIV ou Gregório XVII.

Em vez disso, optou por ser o primeiro e, até agora, único, de uma nova dinastia: Francisco, simplesmente Francisco, the one and only. Depois, Francisco é uma excelente escolha, remetendo de pronto para uma das figuras mais geralmente respeitadas pelo povo cristão (não meramente católico), S.Francisco de Assis, il poverello, o servo dos pobres e ofendidos, o amigo da natureza, o homem culto e rico de nascença que optou pela simplicidade de vida, de palavras e de maneiras. Enfim, uma figura mitológica apropriadíssima para os dias de hoje.

Sem deixar tempo a especulações, a primeira aparição do Papa, escassos minutos após o anúncio da sua eleição, marcou um estilo coerente, pela redução do vestuário ao mínimo apropriado às circunstâncias, prescincindo da tradicional estola papal, dirigindo-se ao povo reunido em frente a S. Paulo numa linguagem despretensiosa, apresentando-se como o bispo de Roma, pedindo a benção dos crentes e, finalmente, desejando a todos uma noite repousada.

No dia seguinte, no seu primeiro acto oficial, deslocou-se numa das viaturas mais vulgares do Vaticano para ir rezar a Maria. Em seguida, no final de uma concorridíssima conferência de imprensa em que falou sobretudo da necessidade de reconstruir um igreja pobre, dos pobres e para os pobres, explicou que não abençoaria os presentes por respeito pelos jornalistas não crentes ali presentes, o que lhe rendeu, como não poderia deixar de ser, uma estrondosa salva de palmas.

Este papa percebe perfeitamente como funciona o sistema mediático comtemporâneo, ávido de construir mitos fantasiosos com um mínimo de matéria prima sólida. Quem não se antecipa a construir rapidamente uma narrativa e a dotá-la de sub-enredos comprováveis e, por isso, credíveis, arrisca-se a deixar-se enlear numa construção desfavorável que depois terá muita dificuldade em desmontar, passando demasiado tempo a defender-se e perdendo, por isso, a iniciativa na luta pela conquista da opinião pública.

O papa construíu assim em pouco tempo e com grande sucesso um posicionamento distintivo, apelativo e credível. Com isso alcançou uma imagem pública fortíssima que, para além de lhe granjear um entusiástico apoio popular, coloca para já em sentido os muitos adversários e inimigos que decerto tem.

26.2.13

Em busca do CEO perfeito

Ron Johnson, ex-chefe das operações de retalho da Apple, foi contratado pelos grandes armazéns J. C. Penney para desempenhar a função de Director Executivo Principal, sem dúvida devido aos espectaculares resultados comerciais atingidos pela empresa fundada por Steve Jobs.

As "receitas infalíveis" que consigo trazia no bolso revelaram-se afinal desastrosas, pela simples razão de que, bem vistas as coisas, a J. C. Penney não é a Apple - nem no que toca à sua capacidade de lançar produtos inovadores que excitam a fantasia dos consumidores, nem no poder que a marca tem para liderar e apontar o futuro.

Tudo isso parece óbvio, como aqui explica James Kwak, mas a verdade é que a racionalidade não impera nos mais restritos círculos da elite empresarial que governa o mundo. Donde esta conclusão:
In the rush to anoint a charismatic savior, hiring committees, search firms, and boards substitute leaps of faith for cold rational inferences, fastening on the bits and pieces of a job candidate’s resume that play to their desire for a superman and overlooking the vast amount they just don’t know (see Rakesh Khurana for more). And this is one reason why external CEO hires tend, in the aggregate, to do worse than people promoted from within, who have the benefit of years of insider knowledge and precisely relevant expertise.

23.1.13

Guidelines para teses de mestrado e doutoramento

Muitas universidades continuam a ser avaras nas orientações que dão aos seus alunos sobre o modo como devem estruturar teses de doutoramento ou de mestrado.

Frequentemente, limitam-se a indicar-lhes as regras que deverão respeitar no que respeita ao número de páginas das dissertações, tipo e tamanho de letra, espaçamento entre linhas, convenções a adoptar nas citações e outras coisas desse género.

Aparentemente, a forma conta mais do que o conteúdo, ou melhor, no que respeita a guidelines, só a forma interessa.

Eu tive porém a felicidade, quando trabalhei na minha tese de doutoramento de descobrir na internet um documento preparado pelo professor australiano Chad Perry para ajudar estudantes e seus supervisores na elaboração de teses de doutoramento ou mestrado na área do marketing.

Uma versão posterior dele foi publicada no Australasian Marketing Journal, vol. 6, no. 1, pp. 63-86. Mais recentemente, em Maio de 2012, o autor procedeu à sua revisão e actualização e disponibilizou-o aqui.

Embora concebida a pensar nos estudantes de marketing, a estrutura proposta é aplicável a teses no campo mais vasto da gestão (e não só). Descarreguem o documento e verão como vos será útil.

14.1.13

Em defesa dos sound bites


Nos últimos dias estive a preparar um trabalho que me levou a olhar com mais atenção para a forma como comunicam os políticos – os nossos e, por exemplo, os americanos. Sobretudo quando vamos aos casos extremos, como um Barack Obama e um Cavaco Silva, a comparação é instrutiva. Permite compreender, pelo gritante contraste, o que torna os nossos governantes comunicadores tão desastrosos.

Obama, como os políticos e líderes empresariais americanos em geral, não trata a comunicação de forma amadora. O talento comunicacional do atual presidente está, é verdade, acima da média, mas de uma média que na América é altíssima. A sua presença, o à-vontade com multidões e câmaras garantiam-lhe, se perdesse a vaga na Casa Branca, uma carreira estelar na televisão ou em Hollywood.

Este estilo de política “à americana” é fácil de desvalorizar e caricaturar. É como se à coreografia superproduzida e à boa oratória devesse corresponder um défice de substância, e o brilhante comunicador que ocupa a presidência estivesse sempre a jogar apenas para os media e para a plateia.
Subjacente a essa visão está um preconceito contra a própria comunicação de massas – que impõe as suas exigências a quem quer que precise dela, seja para entreter, vender ou passar uma mensagem. Os dois primeiros usos, que determinam a natureza e o funcionamento dos mass media, de alguma forma contaminariam a “pureza” do discurso político – mas só aos olhos de quem acredita e valoriza essa pureza.

A mim, ao contrário, parece-me que o sistema americano, ao forçar a escolha de líderes que são também comunicadores, simplesmente valida a capacidade de comunicar como essencial à liderança. E, dentro dessa capacidade, valida também a aptidão para tirar partido de todas as plataformas disponíveis numa sociedade desenvolvida – seja um comício, um debate na televisão, a presença num talk show ou nas redes sociais.

Já a política europeia tem sido exímia em produzir maus comunicadores. E o caso português não podia ser mais ilustrativo.

Fala-se muito, por exemplo, na incapacidade do governo de dar sentido à famigerada austeridade com um discurso de esperança. Será talvez um problema de substância: os nossos “líderes” não conseguem mostrar a luz ao fim do túnel porque eles próprios não a vêem, e não a vêem porque não está lá.
Mas seguramente há também um problema de forma: uma incapacidade de traduzir os argumentos para seguir um caminho, sejam eles bons ou maus, num discurso perceptível e consistente. E, em seguida, de condensar esse discurso em ideias e fórmulas que, repetidas e difundidas de muitas maneiras, mobilizem as pessoas. Sound bites, se quisermos. Mas bons.

Independente da substância do discurso de Obama em 2008, a forma – encapsulada no “Yes, we can” – era imbatível. Quando, já reeleito, promete que para a América o melhor ainda está para vir, pode-se dizer que isto não é mais que uma profissão de fé – mas para que serve um líder se não tem uma fé contagiante? Como perguntava no Público de 10 de Novembro uma leitora, quando é que se viu um político português lançar um sound bite com essa ousadia? “Que se lixem as eleições” é o melhor que temos arranjado.

Como publicitário, sei que esperança é o que todos os anunciantes vendem. Há todo um know-how para criá-la, um know-how a que os detratores da minha profissão chamarão simplesmente manipulação. Mas as pessoas compram essa esperança, e pedem-na aos seus líderes, porque a esperança é um bem em si: mesmo quando não se cumpre (e nunca há garantias) permite que a vida avance.

Os americanos, que são muito melhores a vender do que os europeus, não têm qualquer pejo em transferir para a política o know-how e o ”ethos” da publicidade (ou, já agora, o da pregação religiosa – a outra escola de Obama). Sabem que os argumentos podem convencer e predispor, mas só as emoções mobilizam. Que uma mensagem eficaz tem que ter foco, clareza, coerência, impacto. E, principalmente, tem que traduzir uma compreensão genuína dos sentimentos da audiência – mesmo quando é para vender sangue, suor e lágrimas.

Quando é que os nossos políticos começam a prestar atenção?

Jayme Kopke
da Hamlet

10.1.13

Redes sociais: handle with care

2.1.13

Isto é uma charada


































Graficamente, este regulamento é um muro de tijolos - um único parágrafo sem pausas nem subtítulos que parece especialmente concebido para dificultar a leitura.

Depois, não é nada fácil entender o esquema de acumulação de pontos e de prémios proposto pelo programa Leitor Bertrand. Por mim, desisti ao cabo de cinco minutos, porque tenho coisas mais interessantes ou mais importantes para fazer do que descodificar charadas.

Quem é que quer aderir a um programa assim? E quem é que, depois de aderir, se sente motivado para usar regularmente o cartão, se não é claro o que ganhará com isso?

O marketing relacional não pode produzir os resultados esperados quando a comunicação mais elementar revela um tal desrespeito pelo cliente que a Bertrand alegadamente pretende fidelizar.

Um bocadinho mais de profissionalismo, por favor.

28.12.12

Estagnação e legitimidade

Passou relativamente despercebida uma declaração proferida há duas semanas por Paul Polman, CEO da Unilever, acerca dos cenários macroeconómicos em que essa grande multinacional de bens de consumo correntes fundamenta a sua estratégia para o futuro.

Segundo ele, a Europa enfrenta a perspectiva de10 anos de estagnação e, nos EUA, chegará a 47 milhões o número de pobres que adquirirão alimentos com senhas recebidas dos programas estatais de assistência. "Quem não partir destes pressupostos estará a enganar-se a si próprio", acrescentou.

Em consequência, todas as esperanças de expansão da Unilever se concentrarão nos mercados emergentes (o que, cada vez mais, quer apenas dizer "China"). Em contrapartida, na orla do Atlântico Norte, a orientação será introduzir no mercado variantes "low-cost" das suas actuais marcas, algumas delas previamente desenvolvidas para países como a Índia.

Quando a estagnação começa a ser interiorizada como um estado de coisas normal e, por isso, incorporada nas expectativas dos agentes económicos, ganha uma dinâmica própria e transforma-se numa "self-fulfilling prophecy".

Empresas que não antevêem crescimento não investem, e essa mesma ausência de investimento acentua a tendência para a estagnação. Ora um sistema económico-social que não gera crescimento nem empregos tende a perder legitimidade perante a opinião pública. O mesmo é dizer que, a prazo, está condenado a desaparecer, substituído por sabe-se lá o quê.

6.12.12

Boa estratégia, má estratégia


Este livro não nos propõe novos conceitos ou modelos sobre estratégia. Em compensação, condensa a sabedoria e experiência prática de alguém que leva já uma vida inteira a pensar e a trabalhar em problemas estratégicos de empresas e a ensinar gerações de estudantes a pensar estrategicamente.

A sua mensagem básica é muito simples: conceber estratégias não é mais nem menos do que pensar inteligentemente sobre como tomar as decisões mais apropriadas para o futuro das empresas. Isso implica desde logo abandonar a retórica balofa do corporate-speak que enche não só relatórios de empresas mas também jornais e revistas de negócios.

Para o autor, estratégia é acima de tudo trabalho duro de questionamento, insatisfeito com explicações superficiais, logo ineficazes. É o desenvolvimento de quadros mentais mais exigentes e abrangentes, logo mais susceptíveis de inspirarem manobras ousadas que permitam transformar profunda e duradouramente os equilíbrios competitivos estabelecidos.

De passagem, Rumelt insiste repetidamente nos grandes princípios que distinguem uma boa estratégia: foco, força, surpresa, vantagem, alavancagem, objectivos operacionais e complementaridades, recorrendo a uma instrutiva variedade de situações exemplificativas.

Um excelente e utilíssimo livro, tanto para leitores avançados como para principiantes. Sem dúvida, um dos melhores livros de gestão que li este ano.

30.10.12

A primeira sinfonia colaborativa



Se é possível envolver uma cidade inteira na composição de uma sinfonia, haverá alguma coisa que uma plataforma colaborativa não possa fazer?

6.10.12

Casa de ferreiro

Quando, há uns anos, após quase duas décadas em agências de publicidade, decidi abrir a minha própria empresa, senti aquele frio na barriga que deve ser comum a todo empreendedor de primeira viagem.

“O mercado está tão mau (brrr)… a concorrência tão feroz (brrr)… Será que vou morrer à fome?”

Até que caí em mim: se, depois de tantos anos a construir marcas, eu não era capaz de vender os meus próprios serviços, que diabo de profissional de marketing era eu?

Talvez fosse um raciocínio ingénuo – mas foi o que me encheu de brios para criar a Hamlet. Com o compromisso, que assumi comigo mesmo, de que por aqui não seria "casa de ferreiro, espeto de pau".

Pois foi com esse mesmo pressuposto ingénuo que há uns tempos comecei, por razões várias, a prestar atenção à forma como as nossas escolas de marketing promovem os seus cursos. Pela lógica, se é lá que estão os doutores na matéria, o seu marketing deve ser fantástico, certo?

Bem… as conclusões não foram bem essas (veja-as aqui). Mas depois tive mais um motivo para voltar a pensar no assunto. É que há algumas semanas estive em Chicago para um curso sobre marketing digital. Paguei, por três dias de formação, mais passagem e estadia, quase o que custa um mestrado completo por aqui.

E valeu a pena? Na verdade, já tinha começado a valer antes mesmo de eu embarcar.

A primeira lição de marketing foi a própria forma como conseguiram que me inscrevesse. Como me levaram do cepticismo ao interesse, do interesse ao entusiasmo, até que não tive remédio (eu e muitas outras pessoas do mundo inteiro) senão sacar do cartão de crédito. Magistral. Quer saber como conseguiram?

As escolas de marketing, que nestes tempos difíceis desconfio que têm tido dificuldade em encher algumas turmas, certamente ganhavam em prestar atenção a esta aula. Mas não só elas. Palpito que a maior parte das empresas também ganhava.

21.9.12

Boa malha



A gente vê isto e pensa: fazer boa publicidade é tão fácil, não é? Basta um mínimo de empatia com o público alvo e tudo o resto decorre daí com a maior naturalidade. Até parece que as campanhas se fazem a si mesmas.

Por outro lado, por cada boa campanha que tem como assunto a terrível crise que o mundo está a viver, há literalmente milhões de outras que só revelam hipocrisia e mal disfarçado desprezo pela dignidade pessoal das vítimas.

Pensando melhor, não é assim tão fácil fazer boa publicidade. É mesmo totalmente impossível quando só se tem em vista o ganho imediato.

5.9.12

Muito bom



Estamos tão habituados ao baixo nível da propaganda política que quotidianamente nos é arremessada que não pode deixar de surpreender nesta intervenção concebida por estudantes de Belas-Artes de Lisboa. Bom gosto, sensibilidade e respeito pela inteligência alheia, eis o que eu encontro neste murais de protesto contra o despejo dos habitantes do Bairro de Santa Filomena.

Mais fotos podem ser vistas aqui.

3.9.12

Casos de estudo

Certos jornalistas provincianos gostam de citar determinada empresa, marca ou projeto português como sendo "caso de estudo" nesta ou naquela universidade de renome, querendo com isso dizer que são recomendados como exemplo de boas práticas a seguir em todo o mundo.

Assim, de repente, lembro-me do papel higiénico preto da Renova e das redes elétricas inteligentes da EDP.

Mas caso de estudo não significa caso exemplar. Entendamo-nos: caso de estudo (ou estudo de caso) é o nome que se dá a uma metodologia de investigação de ampla utilização nas ciências sociais (aliás, uma das mais difíceis e exigentes).

Certos casos de estudo são preparados tendo em vista o seu potencial pedagógico, designadamente em cursos de gestão. A sua utilidade consiste em familiarizar os estudantes com o tipo de problemas e decisões com que os gestores são confrontados na vida real, não em levá-los a admirar estas ou aquelas opções de gestão.

Para que esse intuito fique bem claro, é uso o caso ser acompanhado de uma advertência, de que é exemplo esta usada em Harvard: "This case is intended as a basis for class discussion rather than to illustrate either effective or ineffective handling of a business situation".

Assim, se o INSEAD constrói um caso em torno do papel higiénico preto da Renova, isso não significa de modo algum que recomende a estratégia da empresa portuguesa. Entendidos?

1.9.12

Conforme previsto

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28.8.12

Diferenciação por via judicial



Não me sinto ainda capaz de avaliar o mérito dos processos movidos pela Apple contra a Samsung, embora me pareça algo peculiar o mero direito de proteger design e software com patentes.

O que desde já me parece evidente é que, ao acusar a Samsung de ter copiado aspectos centrais dos seus produtos iPad e iPhone, a Apple está implicitamente a admitir que nada de essencial a separa do seu concorrente e que, por conseguinte, é irracional pagar o preço extra que cobra por eles.

Por conseguinte, ou a Apple vence as ações judiciais que colocou em todas as regiões e países do mundo em que as acionou ou corre um sério risco de ser derrotada pela sua rival em todos os mercados, excepto os EUA.

A situação poderá tornar-se ainda mais grave se se gerar entre a opinião pública doméstica a ideia de que a decisão dos tribunais americanos é injusta e apenas se justifica por um impulso protecionista que, em última análise, só prejudica os consumidores.

Perde-se sempre alguma coisa quando o sucesso de uma estratégia de diferenciação depende mais de uma decisão judicial do que de uma efectiva perceção de superioridade.

20.7.12

Como funciona a Local Motors

19.7.12

Executive Master em Marketing Digital

A 1ª edição do Executive Master em Marketing Digital arrancou em Março último com um grupo de alunos altamente motivados. As inscrições para o 2º, com início em Outubro, estão em curso, com condições especiais até ao final de Julho.

Como há dias escreveu o Jayme Kopke, um dos docentes do Master:
Estar no marketing, hoje, sem um domínio mínimo das ferramentas digitais é como estacionar sem o papelinho numa zona vermelha em Lisboa: não vai demorar muito até você ser apanhado em falta. Só que quem o vai castigar não é o homem da EMEL: é o próprio mercado.
Eis o corpo docente: Ricardo Clemente (GroupM Interaction); Jorge Castanheira e Raquel Gonçalves (Wunderman); Nuno Antunes e Rui Almeida (Havas); Luís Veríssimo (Manhattan Project); Jayme Kopke (Hamlet); Nuno Ribeiro (Controlinveste); Francisco Matos Chaves (PT); Pedro Sousa (Holos); André Melo, Rui Rosa e Luís Moniz (SAS); para além de mim próprio.

Para saber mais, clique aqui.